quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Sharkey constroi uma grande mentira a partir de muitas verdades

Torquato Tasso disse há alguns séculos atrás que "Deve-se cobrir a mentira com um manto de verdade". Nestes três anos que se passaram desde o acidente do voo Gol 1907, Sharkey, com o apoio de toda a mídia, cria uma grande mentira a partir de pequenas verdades. É muito inteligente esta estratégia. Sharkey tem dito, à exaustão, que o Controle de Tráfego Aéreo (ATC) brasileiro é precário, falho, que é um dos únicos no mundo ainda controlados pelos militares, que a Amazônia não tem uma boa cobertura de radares e rádios, que os equipamentos são obsoletos e os controladores não estão preparados adequadamente e que, enfim, os controladores brasileiros colocaram o Legacy em rota de colisão com o Boeing. Além disso, acrescenta, que não ficou provado que os pilotos americanos desativaram sem querer o transponder.

Sim, isto tudo é absolutamente verdade, não há o que se discutir.

Entretanto estes fatores, embora pudessem ter contribuído de alguma forma para o acidente, não foi a causa primária, fundamental, essencial para o acidente. O controle de tráfego aéreo colocou o Legacy em rota de colisão com o Boeing? Sim, sem dúvida. O que explica este erro? A resposta é muito simples: justamente sobre Brasília, quando estava planejada uma alteração de altitude do Legacy, o seu transponder foi desativado. O transponder é o equipamento que informa aos controladores a real altitude ocupada pela aeronave. Os controladores passaram a trabalhar com a hipótese, incorreta a partir deste momento, que o Legacy seguia o plano de voo planejado e que a falta de sinal do transponder fosse uma falha trivial de comunicações. O ATC colocou-os em rota de colisão? De certa forma sim, porque não os instruiu, como seria a sua responsabilidade, que ocupassem a altitude planejada. Mas não se pode desconsiderar, como faz Sharkey, que os controladores foram induzidos a este erro simplesmente porque o transponder estava desligado. Não foi uma falha em seus procedimentos ou equipamentos. Ou seja, o erro do ATC em não solicitar que a aeronave alterasse a altitude foi induzido pela incompetência da tripulação em operar corretamente os instrumentos e fez com que o ATC acreditasse que o Legacy já estaria na altitude correta. O ATC não errou em colocar o Legacy na altitude errada, ele errou ao acreditar que o Legacy já estaria na altitude correta. Não se pode admitir que o erro de desligar o transponder possa ser menor do que o do ATC em não perceber que o Legacy não seguia o plano de voo planejado.

Sharkey insiste que os pilotos não desligaram intencionalmente o transponder e que ele pode ter falhado, embora isto não tenha sido provado pelos testes que foram feitos com ele. O que importa isto? Este equipamento, essencial para o ATC controlar o voo, ficou desativado por quase uma hora sem que a tripulação percebesse! Por que o erro da tripulação de não perceber o desligamento é menor do que o erro do ATC não perceber que o Legacy não seguia o plano de voo? O ATC monitora a aeronave através do seu sinal de transponder, é para isto que ele existe. Além disso, a tripulação também não percebeu em momento algum que estava trafegando na “contramão”. Como é possível considerar que esta tripulação não tenha tido a maior responsabilidade deste acidente por sua evidente imperícia em operar os instrumentos e completa ausência de consciência situacional de que estavam trafegando na “contramão”.

O ATC brasileiro poderia ter superado todas estas falhas da tripulação? Sim, sem dúvida, mas este é um país pobre, com problemas muitos mais graves para serem tratados do que investir na cobertura de radares e sistemas de controle de voos em regiões completamente desabitadas como a Amazonia, simplesmente para superar desligamentos de transponders.

Ou seja, Sharkey não mente em suas afirmativas, mas através de muitas verdades não diretamente associadas ao acidente, constrói a grande mentira que o Controle de Tráfego Aéreo brasileiro foi o responsável por este trágico acidente aéreo.

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