quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Cenipa erra na análise da passagem do Legacy sobre Brasília e NTSB se aproveita disto

É muito estranho o Cenipa não saber o que são os serviços de “Vigilância Radar” e “Vetoração Radar”. Aparentemente ele troca as bolas.

Diz o Cenipa:
"A última informação recebida pela tripulação do N600XL, em contato bilateral com o órgão ATC, foi às 18:51 UTC, quando foi informado que a aeronave estava sob Vigilância Radar, conforme o previsto no item 14.11 da ICA 100-12/2006.
Esta condição de vôo foi informada após os pilotos terem acionado a função “identificação” no Transponder, cujo código 4574 foi alocado pelo Centro Brasília, de acordo com o item 14.11.2 ,letra a, da ICA 100-12/2006.
Nessa condição, é responsabilidade do controlador de tráfego aéreo (ATCO) instruir a tripulação a mudar o nível de vôo, uma vez que esta não pode realizar nenhuma mudança de nível de vôo sem a autorização do órgão de controle".

Mas não é isto o que diz a ICA 100-12/2006 sobre vigilância radar:
14.11.4 Durante a prestação do serviço de vigilância radar, a responsabilidade da navegação é do piloto em comando da aeronave.

Apenas quando o serviço é de vetoração radar, que não era o caso do vôo do Legacy, é que a responsabilidade pela navegação da aeronave recai sobre o controlador de vôo; tudo de acordo com ICA 100-12:
"14.12.1 A vetoração radar é o mais completo serviço radar proporcionado. Sempre que uma aeronave estiver sob vetoração radar, será proporcionado o controle de tráfego aéreo e o controlador será responsável pela navegação da aeronave, devendo transmitir para a mesma as orientações de proa e mudança de nível que se tornarem necessárias".

Deve ser observado que, nos termos da ICA 100-12, não se exige a notificação. Por isso não houve contato, via rádio, entre a aeronave e o Centro de Controle. Dizem as normas:
14.19.1 Uma aeronave sob vetoração ou vigilância radar fica dispensada de reportar:
a) os pontos de notificação compulsória;
b) ao atingir ou abandonar um fixo de espera; e
c) ao entrar em nova fase ou perna de um procedimento de saída".

Às 18:51 (UTC) o Legacy entra em contrato por rádio já próximo à Brasília. O diálogo é breve:
Legacy: BRASÍLIA, NOVEMBER SIX HUNDRED X-RAY LIMA. LEVEL… FLIGHT LEVEL THREE SEVEN ZERO, GOOD AFTERNOON.
Brasília: NOVEMBER SIX ZERO ZERO X-RAY LIMA, SQUAWK IDENT, RADAR SUVEILLANCE.
Legacy: ROGER.

O Cenipa comenta sobre este diálogo:
"Assim, como os pilotos do N600XL não receberam nenhuma nova instrução, mantiveram o nível de vôo FL370, o qual era incorreto, naquele sentido de vôo, para a aerovia UZ6".

Em outro trecho o Cenipa comenta:
"Vale, contudo, ressaltar que o fato de estarem sob vigilância radar e ouvindo permanentemente outras conversas entre aeronaves, contribuiu para o relaxamento da tripulação".

Como poderiam "relaxar" se a responsabilidade sobre a navegação era dos pilotos?

O item 14.21 mostra como deve ser a passagem para o controle radar e confirmação de identificação:
"14.21 TRANSFERÊNCIA DE CONTROLE RADAR
14.21.1 A transferência de controle radar deve ser feita sempre que a aeronave passar da responsabilidade de um órgão ou setor para outro órgão ou setor de controle de tráfego aéreo que proporcione serviços radar.
(...)
14.25 CONFIRMAÇÃO DE IDENTIFICAÇÃO
Após o controlador ter aceito a transferência de controle radar de outro órgão ou setor deverá:
a) confirmar a identificação de um alvo primário, informando à aeronave a sua posição;
b) confirmar a identificação de um alvo secundário pela informação de uma mudança de código, por um acionamento “IDENT” ou por uma seleção “STANDBY”, a menos que um desses métodos tenha sido usado durante a transferência;
c) considerar identificada uma aeronave à qual tenha sido atribuído um código discreto; ou
d) considerar a identificação confirmada quando o alvo secundário, ou pista, estiver associado à etiqueta".

Portanto está claro que no único diálogo com Legacy e o Controle eles atenderam perfeitamente as normas técnicas e não tinham porque comunicar à tripulação, que ainda não haviam chegado à vertical de Brasília, que depois de Brasília deveriam alterar a altitude. Não tinham porque fazer isto porque estavam sob o regime de vigilância radar (radar surveillance) e não sob vertoração radar. O NTSB aproveitou-se disto para dizer que o ATC não teve a iniciativa de comunicar a alteração de nível do Legacy. Por que será que o NTSB não apontou o erro do Cenipa?

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

Três perguntas para o NTSB

1. Os pilotos deveriam saber, consultando a carta aeronáutica que estava em suas mãos, que a aerovia UZ6 (Brasilia-Manaus) tem duplo sentido?
( ) Sim ( ) Não
2. Os pilotos deveriam saber que em aerovias de duplo sentido as aeronaves que se dirigem para noroeste ocupam níveis pares e para sudeste ímpares?
( ) Sim ( ) Não
3. Os pilotos do Legacy desconheciam nosso espaço aéreo (alternativa A) ou tinham tendências suicidas (alternativa B)?
( ) Alternativa A ( ) Alternativa B

domingo, 14 de dezembro de 2008

Comentários detalhados aos comentários detalhados do NTSB

NTSB Detailed Comments

NTSB:
ICAO document 4444 defines the purpose of ATC services as “preventing collisions … between aircraft, and … expediting and maintaining an orderly flow of air traffic.” (…) As both of the involved aircraft in this collision were operating under required positive control, and under all applicable directions, ATC services must be examined in detail to determine the factors that initially placed the aircraft into conflict and why ATC services did not resolve the conflict before the collision.
Comentário:
Neste primeiro parágrafo do texto da NTSB já fica caracterizado alguns pressupostos incorretos para a análise de um acidente desta natureza. O propósito da existência de uma organização, ou a sua missão, é a função ou poder que se confere a ela para agir, uma direção, um objetivo. O propósito do Controle de Tráfego Aéreo (ATC) é organizar e disciplinar o tráfego aéreo, e em conseqüência, e não como propósito ou missão, previne as colisões de aeronaves. A principal forma de organizar o tráfego aéreo é muito mais pela regulação, através de normas e procedimentos, do que através de sua ação. O espaço aéreo é altamente regulado, principalmente pelas cartas aeronáuticas e regras de separação. A colisão de aeronaves não pode ser automaticamente imputado a um insucesso do ATC, ao contrário. A regulação do espaço aéreo é de tal forma eficiente que, obedecidas as suas regras, em muitas situações pode-se até mesmo prescindir de sua ação, executando meramente um papel de observador. O controle pode falhar ou pode em determinados momentos sofrer panes. Nestas situações, ou na falta de sua ação, as aeronaves não podem estar sujeitas a risco de colisão. De forma oposta ao que foi argumentado pela NTSB, é que se houve uma colisão no espaço aéreo, é que alguma de suas regras não foi obedecida e não porque houve ausência de ação. A causa do acidente sem dúvida alguma foi dos pilotos estarem trafegando no nível incompatível com a direção e sentido do vôo naquela aerovia. O que deve ser analisado é porque a aeronave agiu contra as regras da aerovia. Nenhuma organização existe para “prevenir” falhas, mas sim para que as ações sejam cumpridas como as normas e regulamentos estabelecem. Quando cumpridas as regras, não haverá falhas. Na sua maior parte do tempo, o ATC verifica, inspeciona se as aeronaves estão cumprindo as normas do espaço aéreo, mais do que posicioná-las ou dirigi-las, função que cabe aos pilotos. A começar pelos planos de vôos que são requisitados pelos pilotos ou por suas companhias em seu nome. O propósito do ATC é autorizar os planos de vôo e não construí-los e, muito eventualmente, resolver conflitos entre aeronaves quando executa ações de seqüenciando dos vôos. De forma muito rara, altera os planos requisitados, e desde que haja razões fortes para isto. O ATC não pode mudar um plano de vôo unilateralmente, sem que isto seja alertado ao piloto, já que o vôo teve sua preparação determinada para o plano requisitado. Muito menos os controladores podem mudar as regras das aerovias. Os primeiros parágrafos do documento da NTSB já demonstraram seus pressupostos equivocados do papel do ATC que segundo eles seriam separar as aeronaves, quando na realidade seu papel primordial é verificar se as aeronaves estão cumprindo as regras de separação regulamentas para as aerovias. Quando as aeronaves não as cumprem, são iniciadas as ações positivas de separação. Portanto, a partir deste ponto já fica extremamente prejudicada a análise do NTSB sobre os eventos que culminaram no acidente ao distorcerem o papel do ATC. Mais surpreendentemente ainda é este partido de análise vir de uma organização como a NTSB que deveria zelar para que normas e regulamentos sejam obedecidos.

NTSB:
The ATC computer automatic insertion of the “cleared altitude” field in the displayed datablock was one of the first chronological events that led to the collision. Sections 4.6 and 4.6.1 of the analysis discuss this feature; however, the only conclusion drawn is on page 219, which states that the controllers “have always operated the system in this manner.” The discussion in the report notes that the controllers did not react correctly to the information presented on the displays. However, a design in which two distinctly different pieces of information (that is, requested altitude and cleared altitude) appear identical on the display is clearly a latent error.
Comentário:
Outro erro grave do NTSB. A apresentação da altitude liberada no bloco de dados (“strip”) estava absolutamente correta e não foi isto que levou a colisão. O bloco de dados não apresenta as altitudes requisitadas e liberadas como afirma o NTSB. O bloco de dados apresenta a indicação do nível de vôo real, obtido pela leitura dos sinais transponder, e o nível autorizado (“cleared”) sempre e nunca o requisitado. Não sei de onde surgiu esta interpretação de “nível requisitado e autorizado” do bloco de dados. Por uma definição de construção, na interface de apresentação dos dados optou-se por indicar “[nível real]=[nível autorizado]”. Assim, se houvesse a presença do sinal do transponder, a indicação seria “370=360”, ou seja, lê-se esta mensagem como: nível real 370, nível autorizado 360. Na ausência do sinal do transponder, não é possível apresentar o nível real da aeronave, e nesta situação, a opção adotada pelos construtores da interface é apresentar a mensagem “360Z360” além da alteração do simbolo da posição da aeronave alterar-se de um círculo para uma cruz. A leitura da mensagem que deve ser feita é: presume-se que a aeronave esteja no nível autorizado para o trecho (360), mas não há certeza porque não há leitura do sinal do transponder, claramente indicado pela letra “Z”, e o nível autorizado para o trecho é 360 (lado direito da mensagem). Esta é a leitura que deve ser feita deste bloco de dados e é a leitura que todos controladores fizeram. O “Z” indicava que a primeira informação do lado esquerdo do bloco de dados (360) não pode ser confirmada. Portanto é surpreendente o comentário de uma organização como a NTSB que nem ao menos sabe fazer a leitura dos dados apresentados nas telas dos radares e é conduzida a comentários equivocados. Os controladores não reagiram apropriadamente, não por nenhuma das razões apresentadas pela NTSB, mas porque não supunham que os pilotos poderiam estar cometendo o erro gravíssimo de estar voando fora das regras da aerovia, ou seja, estar no nível 370, uma das normas mais elementares da navegação aérea. Isto ficou absolutamente claro em todos os depoimentos dos controladores. Ao subestimar a falha dos pilotos de não cumprir as normas do espaço aéreo, agiram como se a situação não exigisse uma ação mais pronta. A provável origem da mensagem (“Z”), para o ATC era uma simples perda de sinal do transponder, algo extremamente comum e ao qual estão habituados, já que se trata de uma comunicação por ondas de rádio e, portanto, sujeitas a constantes interrupções, especialmente por se tratar de um transmissor em movimento (uma aeronave). Portanto, um evento extremamente frequente em qualquer lugar do globo terrestre. A ausência de reação dos controladores, não se deveu à interface de apresentação dos dados como afirmado pelo NTSB, mas à improbabilidade do erro cometido pelos pilotos de trafegar fora das normas da aerovia. A NTSB comete um erro grave neste comentário ao não compreender os eventos que levaram ao acidente. A análise que se segue do NTSB fica completamente prejudicada, pois partiu desta interpretação da tela do radar, de que os controladores tivessem se confundido com elas. As frases que se seguem da NTSB sobre isto passam a ser completamente sem sentido. O comentário equivocado da NTSB apresenta frases como: “It is clear that the sector 7 ATCO believed that N600XL had been cleared to FL360, and that is how he briefed the controller who relieved him, thereby perpetuating the incorrect assumption”. O Legacy foi efetivamente autorizado para o nível 360 de Brasília a Terez e 380 de Terez a Manaus e não 370 e, portanto, a suposição do ATCO setor 7 estava absolutamente correta, e não incorreta como diz o NTSB. O erro do NTSB é assumir que a autorização do nível 370 de S.José a Manaus, por um erro de fraseologia utilizada pelos controladores, fosse efetivamente o nível autorizado, quando não foi. O plano autorizado (“cleared”) foi o plano requisitado. O nível autorizado 370 de S.José a Manaus só existiu na interpretação dos pilotos e, portanto uma análise baseada neste fictício plano autorizado, como a da análise da NTSB, fica completamente prejudicada (voltaremos a este tema). As telas dos radares estão corretas, não foram elas que levaram a falta de ação dos controladores, mas a subestimação do evento em si de uma aeronave voando fora de seu plano autorizado (veremos mais detalhes adiante) e ainda com o transponder desligado.

NTSB:
The automatic change to the “cleared altitude” field did not accurately reflect the status of N600XL’s clearance. There is no distinction between a “requested altitude” value that is serving as a reminder to the controller and a “cleared altitude” value that actually reflects the status of the aircraft’s clearance, as noted in section 4.6. (…) This feature has the undesirable effect of making the ATC automation “lead” the actual clearance issued to the flight crew.
Comentário:
Completamente errado o comentário do NTSB. A mudança automática para a “altitude autorizada” reflete sim o status da autorização para o Legacy. O erro de uma fraseologia não muda uma altitude autorizada. Se o controlador verbalizar uma altitude incorreta, isto não muda a altitude autorizada, especialmente quando estamos nos referindo a sistemas informatizados no qual o que vale é o que está efetivamente registrado nos sistemas. Se o controlador trocar um número na leitura da autorização, ele comete um erro grave, que pode ter graves conseqüências, mas isto não muda o plano que foi autorizado. Pode-se até compreender que a leitura que a tripulação fez da autorização leve a supor outra autorização, mas isto não muda a autorização. O controlador da torre omitiu duas palavras “as filed” porque desconhecia o plano completo, que por sua vez lhe foi fornecido por Brasília. Esta omissão dá margem a uma outra interpretação da autorização, mas não muda o plano autorizado nos sistemas de controle de tráfego aéreo. Os controladores erraram na transmissão do plano autorizado para a tripulação, mas não o alteraram. Considerar o plano de vôo de nível 370 até Manaus como o plano “autorizado” efetivo ("cleared altitude") e querer que os sistemas passem a informá-lo, é um jogo de palavras do NTSB para confundir os leitores. Os pilotos podem estar corretos em interpretá-la como a altitude autorizada, mas efetivamente não foram, nem foi esta a intensão do controle de tráfego.

NTSB:
We recommend modifying the software to make it clear to controllers whether this field of the datablock is displaying a requested altitude or a cleared altitude.
Comentário:
O comentário da NTSB é inconsistente. Os dados que são apresentados na tela dos controladores não é altitude requisitada ou liberada. O conceito da informação apresentada nas telas dos radares não tem a qualificação atribuída pelo NTSB, ou seja, é simplesmente altitude. Quando é introduzida no sistema é a altitude requisitada. Quando informada à tripulação é a altitude autorizada. Se por ventura for necessário autorizar uma altitude diferente da requisitada, é necessário alterar a informação. A altitude autorizada, desta forma, substitui a altitude requisitada. O histórico das altitudes autorizadas é mantido na forma do que se pode chamar de “logs” (registros de alterações de informação) e a altitude requisitada originalmente é preservada no registro do plano de vôo original. A partir daí o que o sistema apresenta nas telas dos controladores é sempre a altitude que foi autorizada e nunca a originalmente requisitada. Um exemplo destes eventos pode ser visto nos dados do Gol. Seu plano original requisitava nível 410. E isto o que apareceria na tela no início do vôo: “410=410”. Nível real 410, autorizado 410. O piloto antes da decolagem requisitou alteração para o nível 370, no que foi atendido. A tela passou a apresentar “370=370”, nível real 370, nível autorizado 370. O nível 410 não aparece mais nos consoles. Mesmo que o Gol tivesse perdido o sinal do transponder o console não apresentaria a mensagem "410Z370", mas sim "370Z370". Ou seja, sempre o que aparece no bloco de dados da tela é o nível autorizado e nunca o requisitado. Se na tela apareceu 360 para o Legacy é porque foi este o que foi autorizado. O autorizado 370 foi somente até Brasília. Fraseologias incorretas, como a do controlador da torre, não mudam sistemas. Se o controlador, ao invés de ler 370 tivesse lido 380, isto não altera o plano autorizado para 380. Ainda não chegamos ao ponto de através de reconhecimento de voz de controladores alterar automaticamente o plano de vôo autorizado. É surpreendente que a NTSB não saiba disto.

NTSB:
However, in the body of the report, it is correctly noted that the “Z” symbol appeared in the datablock as well as the loss of the circular target marker and that both indicated that mode C information had been lost. There is no reason to believe the controllers did not understand the datablock information; however, they either were not aware of it or did not attach the appropriate level of significance to it. This training and awareness issue will be discussed in the next section, but the fact that the 3D altitude values reinforced an incorrect assumption leads us to conclude that the automatic display of an altitude value that is invalid for ATC use contributed to the accident scenario.
Comentário:
Parece que o NTSB após todos estes meses ainda não compreendeu o acidente. A forma como os dados apareceram nas telas dos radares não teve nenhum, o mínimo, o mais insignificante papel para a contribuição do acidente. A tela do radar apresentava a clara informação de que o transponder não apresentava sinal, através da indicação “Z”. Mas os controladores subestimaram o problema, pois é inacreditável que alguém voasse em um nível impar na rota Brasília a Manaus e não imaginaram que a origem do problema estivesse relacionado a autorizações. Pilotos em geral, com exceção dos Kamikazes, não tem tendências suicidas. Portanto, voar por 3.490 km na contramão é algo que não passa pela cabeça de ninguém com um mínimo de juízo, e muito menos o supunham os controladores. Para eles, então, tratava-se de um problema insignificante de ausência temporária do sinal do transponder, como ocorre inúmeras vezes, eu diria que várias vezes ao dia. Lembre-se que o transponder funciona através de ondas de rádio, portanto, qualquer um que tenha um celular sabe que equipamentos desta natureza sofrem freqüentes interrupções de sinal. Portanto, para os controladores era mais um dos freqüentes problemas que ocorrem em todo o globo, centenas de vezes por dia, de ausência temporária do sinal do transponder. Especialmente freqüente quando estamos falando em distâncias continentais como a de Brasília a Manaus. Foi simplesmente isto, e nada mais do que isto. Não agiram, porque o risco de alguém voar na contramão de Brasília a Manaus era inimaginável. Todas as análises que se seguem do NTSB baseadas nas informações do radar ou dificuldades de comunicações não tiveram qualquer influência para justificar a falta de iniciativa dos controladores. Os controladores simplesmente não agiram porque subestimaram o risco por seu caráter insólito e não porque foram confundidos por informações erradas.

NTSB:
As noted in the report and related to the above findings, ATC continued to apply a projected vertical separation standard of 1,000 feet between N600XL and GLO1907, although there was no transponder return or two-way communications from N600XL.
Comentário:
Todos os comentários do NTSB que se seguem sobre a falta de iniciativa dos controladores perdem sentido já que não perceberam o risco de colisão. Foi o segundo erro dos controladores (o primeiro foi em S.José), superestimar a capacidade dos pilotos em lerem cartas aeronáuticas e assim perceber que voar de Brasília a Manaus em um nível impar era uma tentativa de suicídio, ou melhor, uma roleta russa. Se os controladores adotarem iniciativas extremas de emergência a cada caso de perda de sinal de transponder não farão outra coisa. Não se pode culpar alguém por não adotar todos os meios disponíveis quando o risco que corriam as aeronaves ultrapassava a imaginação de qualquer um que tivesse um mínimo de conhecimento do espaço aéreo brasileiro. Pode-se imaginar que aeronaves enfrentem pane ou dificuldades de comunicação ou qualquer outra dificuldade, mas não se imagina que pilotos trafeguem em trechos tão longos, como de Brasília a Manaus, com a proa para noroeste em um nível impar. Nem o mais sagaz controlador poderia supor que em nossos céus voassem pilotos que desrespeitam as regras das aerovias.

NTSB:
The controllers at sectors 5 and 7 were unaware of the status of N600XL’s altitude clearance and did not take positive action to provide a clearance, confirmation, or appropriate coordination.
Comentário:
O NTSB prossegue em seus comentários como se os controladores desconhecessem um plano autorizado no nível 370 até Manaus. Esta autorização nunca existiu, portanto não tinham porque tomar nenhuma ação positiva para fornecer uma autorização, confirmação ou coordenação apropriada. A autorização no nível 370 até Manaus foi assim compreendida pelos pilotos, mas nunca existiu (voltaremos ao assunto).

NTSB:
The report correctly notes that the initial clearance issued to N600XL before departure from São José dos Campos did not follow the correct format for an initial clearance. However, we believe that the ground controller’s statement “clearance to Eduardo Gomes,” could not realistically be interpreted as anything other than the “clearance limit” item of the clearance. Furthermore, numerous statements in the report imply that issuance of a clearance limit, whether for the intended destination or an intermediate navigational fix, correlates with the assigned altitude.
Comentário:
Estamos chegando às questões mais importantes. O NTSB deixa claro que a autorização emitida em S.Jose não seguia o formato correto para uma autorização inicial. Portanto, admitida a sua incorreção, isto abre espaço para interpretações. Tanto é verdade que na argumentação o NTSB utiliza as expressões: “we believe... could not realistically be interpreted...”. Sabemos que não é esta a interpretação que os controladores queriam que os pilotos dessem à autorização. Em nenhum momento foi feita qualquer modificação do plano de vôo solicitado pelos pilotos, que previam diversos níveis até Manaus. Em nenhum momento surgiu conflitos no espaço aéreo que os obrigassem a autorizar um plano de vôo diferente do requisitado. Mas o NTSB sabe que planos de vôo não devem ser interpretados, deve-se ter certeza sobre suas intenções. Além disto não é esta a interpretação dos pilotos que lêem o Flight Information Publication (FLIP) do Departamento de Defesa americano (DoD), que contém dados aeronáuticos para planejamento de vôos. Na seção sobre a América do Sul adverte: “NOTE: Many South American countries use the term “Cleared Direct” to a fix when they mean for the pilot to fly via the flight planned route to the final destination or fix cleared to. Use caution when accepting a direct route to a fix, or query the controller as to his/her true expectations (TFMWG-CSA)”. Ou seja, a interpretação lógica (“realistically”) do DoD é que siga o plano de vôo quando um controlador no Brasil disser: “ATC clearence to Eduardo Gomes, flight level three seven zero direct Poços de Caldas”. De qualquer forma, as normas aeronáuticas internacionais exigem que não haja dúvidas ou interpretações. O NTSB deveria ler as normas aeronáuticas que dizem: “A pilot in command shall, if any time in doubt, request a detailed description of the route from Air Traffic Services (ICAO 7030/4/SAM RAC 5.1)”. Mas assim como o NTSB, os pilotos não ficaram na dúvida alertada pelo DoD a pilotos que não estão habituados a voar na América do Sul e fizeram a única interpretação "lógica" que lhes ocorreu. Portanto fica claro que o plano autorizado no nível 370 até Manaus foi uma interpretação do plano realmente autorizado tanto pelos pilotos como pelo NTSB e não um plano real. Mas uma interpretação não muda um plano de vôo, só se os operadores o tivessem introduzido nos sistemas de controle de tráfego (vamos aprofundar esta discussão no comentário seguinte).

NTSB:
Beginning on page 92 and recurring throughout the report are numerous passages and citations of events that are associated with the flight crew of N600XL not being aware of the elements of the flight plan, an unusually short time elapsing between the obtainment of the printed flight plan and the departure, or the crew having an unusually short period of time to prepare for the flight. These items appear to be partly in support of paragraph (e) on page 264 of the report, which indicates, “Planning – a contributor.” We do not agree that the analysis is sufficient to support any deficiency in the conduct of the flight, which can be related to planning. The crew flew the route precisely as cleared and complied with all ATC instructions.
Comentário:
Argumenta que a falta de preparação dos pilotos não contribuiu para o acidente porque os pilotos seguiram exatamente a autorização emitida. Ora, o NTSB já reconheceu que a autorização era incompleta e omissa, portanto o que eles seguiram não foi a verdadeira autorização, mas, nas suas próprias palavras, uma interpretação lógica da autorização emitida. Esta interpretação foi a causa principal do acidente. As autoridades aeronáuticas americanas, através de seus regulamentos, discordam frontalmente do NTSB quanto à preparação para o vôo. A seção “5−1−1. Preflight Preparation” do Aeronautical Information Manual (AIM) da FAA diz: “Every pilot is urged to receive a preflight briefing and to file a flight plan. This briefing should consist of the latest or most current weather, airport, and en route NAVAID information.” e a seção “7−5−1. Accident Cause Factors” do AIM ainda diz com grande propriedade: “The 10 most frequent cause factors for general aviation accidents that involve the pilot-in-command are: 1. Inadequate preflight preparation and/or planning”. Ou seja, independente se isto foi um fator contribuinte ou não, a regulamentação destaca sua importância. Mas como veremos, foi sim um fator contribuinte mais forte do acidente. A preparação é justamente para que os pilotos tenham senso crítico sobre as ações do controle de tráfego e formar sua consciência situacional para prevenção de acidentes. O NTSB analisa a autorização para voar de Brasília a Manaus na contramão como se fosse uma autorização normal, corriqueira, trivial e aceitável e não uma sentença de morte. Basta qualquer um, piloto ou não, olhar a carta aeronáutica e ler sua legenda que se verá o absurdo que seria uma autorização para voar 3.490 km na contramão. Não há nenhuma razão possível, nenhuma hipótese, que faça o ATC emitir uma autorização em nível ímpar nesta rota. Qualquer piloto que conhecesse o espaço aéreo, veria que a autorização estaria incorreta. A certeza para todos que se envolveram com um olhar um pouco mais atento sobre este acidente é que não importa que erros tivessem cometido os controladores, não se admite voar pela aerovia UZ6 no nível 370. Nem o piloto mais inexperiente, nem um jovem em um simulador de vôos, cometeria este erro, somente aqueles que desconhecem o espaço aéreo. Ouvi isto de um piloto de jatos executivos nos primeiros dias que se seguiram o acidente. O NTSB desconsidera totalmente este fato ou o mascara através de uma “interpretação lógica” de uma autorização incompleta. A preparação dos pilotos, considerada desnecessária pelo NTSB porque seguiram a autorização, os faria rejeitá-la imediatamente. Mas ainda muito mais grave que tudo isto, é que é inaceitável uma autorização que fira normas e regulamentos, não só por prudência mas porque as normas aeronáuticas o exigem. Vejam como são claras as normas aeronáuticas e desconsideradas pelo NTSB: "It is the pilot's responsibility to request an amended clearance if the pilot decides that the clearance ATC issued would cause deviation from a rule or regulation or place the aircraft in jeopardy". Se os pilotos observassem sua carta aeronáutica teriam visto que a autorização que o controle emitiu, considerada a interpretação "lógica" dada pelos pilotos e NTSB, feria a norma mais elementar de regulação do tráfego aéreo, ou seja, trafegar em um nível apropriado para o trecho de Brasília a Manaus e que a autorização que lhes fora “ordenada” era uma certeza de colisão. É responsabilidade dos pilotos solicitar uma autorização corrigida se ela colocar em risco a segurança. Mas o despreparo dos pilotos nem mesmo os fez perceber que está autorização punha a aeronave em risco. Como pode o NTSB desconsiderar, eu diria até mascarar, este fato? O NTSB argumenta que o ATC pode autorizar qualquer nível quando estão sob o seu controle radar e portanto os pilotos não descumpriram qualquer regra. Esta é a mais absurda argumentação que poderiamos ouvir. Não é isto que se discute, mas a ausência da consciência situacional dos pilotos ao receberem uma autorização que indiscutivelmente colocava a aeronave em risco de colisão. não a rejeitaram. Como alguém pode interpretar uma autorização que confronta a mais elementar regra do espaço aéreo e os levaria à morte, sem a menor contestação? Portanto, seria obrigação dos pilotos que a rejeitassem, e mesmo que fosse confirmada, deveria ser rejeitada, até mesmo abortando a decolagem para esclarecimentos. Não há uma razão sequer para se aceitar uma sentença de morte sem contestação. Além disto, uma simples pesquisa pelos fóruns dos pilotos, veremos que é extremamente comum, no mundo todo, autorizações verbais incompletas, as vezes totalmente incorretas. São centenas de mensagens colocados sobre dúvidas dúvidas dos pilotos sobre as autorizações. Mas a consciência situacional dos pilotos, adquirida através do conhecimento das rotas aéreas, os fazem identificar os erros frequentes presentes em uma comunicação verbal.

NTSB:
Pages 69 and 74 of the report state that the flight crewmembers were not experienced in the operation of the avionics in N600XL. Although the transponder outage was likely because of an inadvertent action, no evidence in the factual record indicates that a lack of familiarity with the avionics is related to the outage.
Comentário:
Admirável a ausência de compreensão do NTSB das causas do acidente. Em nenhum momento foi dito que os pilotos operaram erradamente os instrumentos pela sua não familiaridade em seu manuseio. Ficou claro também que o desligamento do transponder foi involuntário. O que se afirmou é que a falta de familiaridade dos pilotos com os instrumentos levou-os a passar quase o tempo todo envolvidos com outras atividades relacionados ao novo avião em seu primeiro vôo ao invés de estarem atentos aos instrumentos. Espera-se que durante o vôo os pilotos estejam atentos à navegação aérea e ao monitoramento dos instrumentos e não dedicados a leitura de seus manuais. Eu gostaria que alguém nos dissesse como se sentiria se durante um vôo presenciassem os pilotos na cabina estudando os manuais da aeronave, hoje digitais, em seus notebooks? Eu pediria encarecidamente que deixassem isto para outra hora, e por favor, prestem atenção no painel de comando. A causa de não notarem que o painel primário apresentava a mensagem “TCAS OFF” é porque por quase uma hora estavam com um notebook à frente do painel. Não resta a menor dúvida de que os pilotos passaram horas envolvidos com cálculos de combustível, equilíbrio da aeronave, e outras características da aeronave em que faziam seu primeiro vôo. Que pilotos passam o vôo todo estudando a aviônica da aeronave? Somente aqueles que não têm nenhuma familiaridade com ela. Sem dúvida alguma a falta de familiariaridade com a aviônica da aeronave distraiu-os completamente, a ponto de não perceber o desligamento inadvertido do transponder, e isto foi sem dúvida o fato culminante para o evento trágico.

CONCLUSÕES SOBRE OS COMENTÁRIOS DO NTSB:
O NTSB tem um processo cognitivo dos eventos que culminaram com este acidente completamente equivocado e, de certa forma, pode ser compreendido pela sua explícita tendenciosidade. Sua introdução aos comentários, construída por meio de fragmentos de frases da ICAO, de que a missão do controle de tráfego seria “prevenir acidentes” deixa isto estampado. É claro que a missão do Controle de Tráfego Aéreo não é esta, e sim organizar e disciplinar o tráfego aéreo e faz isto através da vigilância e do seqüenciamento dos vôos. Prevenir acidentes é uma conseqüência natural da vigilância do espaço aéreo e não missão. Como o espaço aéreo é fortemente regulado, se houve uma colisão é porque alguém feriu alguma regra e não simplesmente porque o controle de tráfego falhou. Ao constatar-se que o Legacy estava em nível incompatível para a aerovia, a causa não pode ser mais óbvia. Sim, o erro foi induzido pelo controle de tráfego aéreo. Sim, os pilotos não violaram nenhuma regra aérea pois poderia-se admitir que estavam autorizados a voar nesta altitude, mas não há a menor dúvida que faltou completamente consciência situacional aos pilotos do Legacy e isto o fez aceitar uma autorização que os colocou em rota de colisão com outras aeronaves. Ao já se ter como pressuposto que foi uma falha do controle, o NTSB direcionou sua análise na busca das falhas do controle de tráfego aéreo em não previnir o acidente e relevou as dos pilotos em provocá-lo. Considerou a autorização emitida para o Legacy como uma autorização aceitável e inquestionável, quando era indiscutivelmente uma sentença de morte ao colocá-los na contramão por 3.490 km, ferindo a mais elementar das regulações do espaço aéreo que é a vinculação entre direções, sentidos e altitudes dos vôos. A não ser que a tripulação tivesse tendências suicidas, esta interpretação “lógica” da autorização deveria ser rejeitada de imediato por ferir a norma básica de que aeronaves nunca voam na aerovia UZ6 no sentido de Brasília a Manaus em um nível impar. Reitero a expressão "nunca". O NTSB, em completo desrespeito às proprias normas aeronáuticas internacionais, considera desnecessária a preparação para o vôo e que a falta de familiaridade dos pilotos com nosso espaço aéreo tenha contribuido para o acidente. Segundo o NTSB, basta seguir a autorização que lhes era informada, mesmo que esta autorização fosse contrária às regras do espaço aéreo. Desconsidera que ninguém é ordenado a colocar sua vida e de outros em risco por mais "lógica" que seja esta ordem. Ao contrário do que pensa o NTSB, a preparação dos pilotos, conhecendo seus diversos níveis de vôo, adequados às regras do espaço aéreo e ao consumo de combustível, os faria rejeitar, sem sombra de dúvida, a interpretação do plano de vôo em um único nível, se não para não ferir as normas de tráfego, mas pela razão básica de preservar a própria vida e de outros. A falta de familiaridade dos pilotos com a aviônica da nova aeronave também não foi um fator contribuinte segundo a NTSB, pois não fizeram nada errado na sua operação. Entretanto, o NTSB desconsidera que foi isto que fez os pilotos passarem todo o vôo estudando-a, concentrados nos novos manuais, conhecendo os novos instrumentos e desligar o transponder sem perceber através de algum gesto inadvertido. Sua falta de concentração nos instrumentos, e sim nos estudos da nova aviônica, fez passar-lhes despercebida a mensagem “TCAS OFF” em seu painel durante quase uma hora, algo também injustificável. Ao mesmo tempo que releva a falta de atenção dos pilotos em não observar o painel da aeronave que apresentava a gravíssima situação do desligamento do transponder, aponta a falta de iniciativa dos controladores em acionar procedimentos de emergência diante de um evento trivial que é a falta de comunicação. Não é capaz de compreender que nem o mais sagaz dos controladores poderia imaginar que os pilotos tinham tamanho desconhecimento das regras de navegação aérea a ponto de ter como uma interpretação “lógica” de uma autorização incompleta, voar na contramão em um trecho de extensão continental. Diante desta equivocada análise do NTSB, não é de se admirar que impute ao ATC a responsabilidade do acidente. Mas o que mais nos decepciona é a lição de insegurança de vôo que o NTSB passa a todos os pilotos ao desprezar a preparação que devem ter para os vôos, desprezar a necessidade de senso crítico dos pilotos ao interpretar uma autorização que fere a mais elementar das regras do espaço aéreo e o desprezo ao monitoramento dos instrumentos de navegação. O NTSB com seus comentários presta o maior deserviço que a segurança da aviação mundial poderia ter. A proteção a qualquer custo de seus conterrâneos terá um preço alto para a segurança da aviação mundial.

sábado, 13 de dezembro de 2008

Falta justificativa do nexo causal no pedido de indiciamento pelo acidente da TAM

Estado – 12/12/2008 - MPE pede indiciamento de 11 pessoas pelo acidente da TAM
Estado – 12/12/2008 - Perícia aponta falhas de TAM, piloto, pista e Anac em acidente

O Ministério Público Estadual pediu o indiciamento de onze pessoas por responsabilidade culposa (não intencional) pelo acidente com Airbus da TAM em Congonhas. Este indiciamento é “para inglês ver”. Não terá nenhuma conseqüência. Falta o nexo causal, ou seja, faltam os elementos necessários para se vincular a conduta dos agentes às causas do acidente. Até agora a única e exclusiva causa do acidente apurada pela perícia foi a posição incorreta do manete. Não houve contribuição da pista e nem ao menos o reverso estar pinado ferir qualquer norma técnica. Pode ter havido conduta criminosa dos agentes, mas que não tem vínculo com o acidente. Por exemplo, alguns agentes podem ser culpados por liberar a pista, mas não há nexo causal entre este fato e o acidente, já que não houve contribuição da pista para a ocorrência do acidente. Portanto, a punição só poderá estar circunscrita ao crime de exposição de perigo de vida e de saúde de outros, mas nunca por homicídio culposo neste acidente específico, pois não foi isto que causou o acidente. Outro exemplo: uma eventual falha de manutenção, que também não esteja vinculada ao acidente, também poderá ser investigada como crime de periclitação da vida, mas também não causou o acidente. O Ministério Público acredita que as condições na ocasião do acidente afetaram psicologicamente o piloto. Alguém crê que algum dos indiciados será punido por afetar psicologicamente os pilotos? Se alguém acredita, pode tirar o cavalinho da chuva.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Quando cada um quer enxergar os fatos como lhe convém

NTSB Comments to Draft Final Report of the Aircraft Accident Involving PR-GTD and N600XL:
US Summary Comments
US Detailed Comments

Embora os fatos apurados no acidente da Gol 1907 tenham ficado absolutamente claros, a interpretação dominante pela maior parte da imprensa como do NTSB é completamente contrária ao mínimo de racionalidade e bom senso.

O NTSB – National Transportation Safety Board, distorcendo completamente os fatos, insiste em que o Legacy foi autorizado a voar na altitude de 37.000 pés de Brasília a Manaus e esta é a causa do acidente. O desligamento do transponder é secundário. Desenvolve seus comentários, a partir de uma suposta intencionalidade do controle de vôo de que os pilotos utilizassem eo nível fatal do vôo, quando todos sabemos que esta foi uma interpretação equivocada dos pilotos em um confuso diálogo com a torre no momento da partida, quando a aeronave se preparava para taxiar. Desconsidera completamente que havia um plano de vôo na imaginação dos pilotos e um plano requisitado pela tripulação e autorizado pelo controle de vôo. É claro que é admissível que a autorização poderia ser compreendida desta forma, mas não se pode construir todo um raciocínio de que esta foi a "autorização real", como o NTSB a denominam em muitas passagens do texto. Isto chega a ser um jogo de palavras, para confundir os leitores.

Vejam os comentários do NTSB:
“The evidence collected during this investigation strongly supports the conclusion that this accident was caused by N600XL and GOL1907 following ATC clearances which directed them to operate in opposite directions on the same airway at the same altitude resulting in a midair collision”.

Pode-se entender a motivação desta conclusão quando constatamos a atitude e postura da NTSB diante deste acidente, com julgamentos pré-formados. Dizem, ao comentar suas divergências com o relatório do Cenipa, por exemplo:
“(…) the interpretations, conclusions, and understandings of the relationship between certain factual items and the demonstrated risk differ in a number of respects. For example, the report states that the investigation was based on the following four focal points: functioning of equipment on board N600XL, preparation of the flight crew, ATC rules and procedures, and functioning of Brazilian airspace system. The U.S. team believes that these points all stem from the basic investigative question, namely, how the primary mission of ATC to separate aircraft within positive controlled airspace was unsuccessful. This investigation has identified many safety issues for ATC operations, but these issues need to be further highlighted”.

Ou seja, já que separar aeronaves é uma missão do controle de tráfego aéreo, eles é que devem ser objeto de investigação da apuração do acidente. Gostaria de entender o sentido da frase incompreensível que o funcionamento dos equipamentos e a preparação da tripulação derivam da mesma questão de investigação: a missão do controle de tráfego separar as aeronaves. Isto é absurdo. Ou seja, eles já têm como premissa de análise que se os aviões se chocaram, o controle de tráfego falhou em não mantê-los afastados. Um posição já tomada a priori e completamente tendenciosa. Mesmo com negligência, imperícia e imprudência da tripulação, a falha, por seus pressupostos, é sempre do controle de tráfego aéreo pois não foi bem sucedida em separar as aeronaves. É o mesmo que afirmar que se alguem morre sob os cuidados de um médico, este falhou na sua missão de salvar vidas e é ele que deve ser o foco da investigação e não a saúde do paciente. Missão é função ou poder que se confere a alguém para agir, uma direção, um objetivo, é o sentido de uma organização existir. Nem sempre se é bem sucedido. Um médico que não é bem sucedido em salvar uma vida, não é mal sucedido em sua missão, ele fez tudo que estava ao seu alcance, mas existem situações sobre as quais ele não tem controle. O comentário do NTSB é um dos mais infelizes que já ví na apuração desta tragédia, mas de certa forma explicita todo os seus "pré-conceitos" diante deste evento e não poderia ser de forma diferente já que era esperado que agisse sem isenção.

Esta discussão parece bizarra, ou seja, se podemos utilizar outra analogia, seria diante de um assassinato cometido por dois criminosos, um com uma espingarda e um com um canivete, debater quem é o mais culpado pela morte da vítima, e qual a ênfase que deve ser dada no inquérito que apurou a causa mortis: a canivetada ou o tiro. O que importa isto? O NTSB não é capaz de colocar uma dúvida sequer no relatório, mas acha que o Cenipa dá ênfase demais ao desligamento do transponder e isto seria secundário. Ou seja, em um relatório que é tido como factual, discute-se a se o fato A ou B é mais importante.

Ficou absolutamente claro em toda a investigação que em nenhum momento o controle de tráfego aéreo teve a intenção de liberar todo o vôo do Legacy no mesmo nível. Esta é a origem de todo o evento: a fraseologia incorreta dos controladores, mas habitual no Brasil. Esta é uma das questões que deve ser exaustivamente analisada neste acidente: como uma fraseologia incorreta, mas surpreendentemente, utilizada há tantos anos no Brasil, e eu diria mais, segundo o Departamento de Defesa americano, em muitos países da América do Sul, sem que isto tenha sido corrigido este tempo todo. Todos os controladores envolvidos fizeram declarações enfáticas neste sentido. É esta a razão dos computadores, telas de radares e todo o sistema de controle de tráfego aéreo apresentarem outros níveis autorizados no trecho de Brasília a Manaus. O NTSB, desconsidera tudo isto e conduz toda sua análise como se o controle tivesse a intenção de que o Legacy voasse no nível 370, mesmo sabendo que isto é absolutamente falso e chega a apontar falhas dos sistemas de controles em não apresentar aos controladores esta "autorização verdadeira". Até os pilotos mostraram claramente dúvidas de qual nível haviam sido autorizados, mas o NTSB não. Para ilustrar esta questão, podemos ver comentarios do NTSB como este:
“This scenario explains why the use of the automatic “cleared altitude” field change has the potential to mislead controllers, is a poor human factors design, and is a clear finding of risk. In fact, this event was one of the first that is directly tied to the accident scenario. This feature has the undesirable effect of making the ATC automation “lead” the actual clearance issued to the flight crew”.

Que autorização verdadeira ("actual clearance") é esta emitida à tripulação? A da cabeça dos pilotos? A das palavras do controlador da torre de S.José? Sua análise fundamenta-se em uma inexistente autorização emitida para tripulação diferente da requisitada. Se quiserem argumentar que a autorização estava errada e levou os pilotos à uma compreensão de que estavam autorizados a voar em um único nível, SIM, estão certos, levou os pilotas a esta interpretação equivocada. Mas não se pode conduzir a análise a partir do pressuposto de que existiu esta autorização e que os sistemas falharam ao não apresentá-la nos radares. Trata-se de uma análise totalmente equivocada e demonstra cabalmente sua tendenciosidade.

Entendam a confusão observando o diálogo bizarro mantido pelo piloto e a torre de S.José dos Campos, já exaustivamente comentado neste blog e em nenhum momento comentado pelo relatório do NTSB, que extraiu dele uma única frase, a da autorização, para considerá-la como a "verdadeira autorização":
N600XL: CLEAR TO TAXI THE RUNWAY ONE FIVE, WE HAVE, WE’RE LOOKING FOR CLEARENCE. WE DON’T HAVE ONE YET (ININTELIGÍVEL).
GNDC-SJ: ARE YOU READY TO COPY THE CLEARENCE?
N600XL: AH, AFIRMATIVE, YES.
GNDC-SJ: NOVEMBER SIX ZERO ZERO X-RAY LIMA, ATC CLEARENCE TO EDUARDO GOMES, FLIGHT LEVEL THREE SEVEN ZERO DIRECT POÇOS DE CALDAS, SQUAWK TRANSPONDER CODE FOUR FIVE SEVEN FOUR. AFTER TAKE-OFF PERFORM OREN DEPARTURE.
N600XL: OKEY SIR, I GET (ININTELIGÍVEL), FLIGHT LEVEL THREE SEVEN ZERO (ININTELIGÍVEL), SQUAWK FOUR FIVE SEVEN FOUR, OREN DEPARTURE.
GNDC-SJ: AFIRMATIVE, ÉH BRASÍLIA CENTER FREQUENCY ONE TWO SIX DECIMAL ONE FIVE, IF ENABLE, CONTACT ONE THREE THREE DECIMAL FIVE.
N600XL: KEY, FREQUENCY ONE TWO SIX DECIMAL ONE FIVE, ONE THREE THREE DECIMAL FIVE FOR ALTERNATE. AND WHAT INITIAL ALTITUDE FOR CLEARENCE? AH, SAY AGAIN, PLEASE? (MENSAGEM COM INTERFERÊNCIA) ALTITUDE FOR TAKE-OFF?
GNDC-SJ: ÉH CLEAR TAXI TO HOLDING POINT RUNWAY ONE FIVE, AND REPORT READY FOR TAKE-OFF.
N600XL: OKEY, CLEAR TAXI TO HOLDING POINT ONE FIVE, SIX ZERO ZERO X-RAY LIMA.
N600XL: SÃO JOSÉ GROUND, NOVEMBER SIX ZERO ZERO X-RAY LIMA.
GNDC-SJ: ÉH, SIX ZERO ZERO X-RAY LIMA GO AHEAD.
N600XL: YES SIR, AFTER TAKE-OFF, WHAT ALTITUDE YOU’D LIKE (ININTELIGÍVEL).
GNDC-SJ: AFTER TAKE-OFF REPORT OREN DEPARTURE, OSCAR ROMEU ECHO NOVEMBER, TRANSITION POÇOS DE CALDAS.
N600XL: SIX ZERO ZERO X-RAY LIMA ROGER.

(Obs: que diabo de transcrição do Cenipa é esta ÉH??? O que eles estão querendo dizer? Que o controlador estava dizendo Yeah e cuja transcrição é éh?)

É este o diálogo que direcionou os pilotos a voarem no nível 370 de Brasília a Manaus. Este diálogo mais parece uma conversa de doidos do que uma autorização!!! É o diálogo mais maluco que poderia se observar em uma partida de aeronave. É o diálogo que o NTSB considerou que suplantou todo o planejamento do vôo, cálculos de combustível, velocidade e conformidade às regras do espaço aéreo e registros no sistema informatizado de controle de vôo. Poderia-se ententer qualquer coisa por este diálogo. Vê-se claramente que Lepore não tinha o menor conhecimento sobre o seu plano de vôo. Não entendeu “Eduardo Gomes e “Poços de Caldas”, não sabia do que se tratava, já que as conheciam somente por siglas. Não sabiam que sua companhia havia preparado um plano de vôo detalhado; que sua rota era complexa, com diversos níveis de vôo.

Mas é preciso que se reflita, porque os pilotos não entenderam a autorização e se produziu este diálogo insólito. Esta é a raiz deste grande equívoco e não discutida pela NTSB. Em primeiro lugar é preciso saber que os pilotos têm a obrigação de se prepararem para o vôo. Vejam o que diz a seção “5−1−1. Preflight Preparation” do Aeronautical Information Manual (AIM) da FAA:
“a. Every pilot is urged to receive a preflight briefing and to file a flight plan. This briefing should consist of the latest or most current weather, airport, and en route NAVAID information.”

A seção “7−5−1. Accident Cause Factors” do AIM ainda diz com grande propriedade:
“a. The 10 most frequent cause factors for general aviation accidents that involve the pilot-in-command are:
1. Inadequate preflight preparation and/or planning.”

Mas o NTSB, neste episódio, não concorda e tem outra opinião sobre o planejamento e preparação para o vôo. Diz em seus comentários:
"(...) the report are numerous passages and citations of events that are associated with the flight crew of N600XL not being aware of the elements of the flight plan, an unusually short time elapsing between the obtainment of the printed flight plan and the departure, or the crew having an unusually short period of time to prepare for the flight. These items appear to be partly in support of paragraph (e) on page 264of the report, which indicates, “Planning – a contributor.” We do not agree that the analysis is sufficient to support any deficiency in the conduct of the flight, which can be related to planning. The crew flew the route precisely as cleared and complied with all ATC instructions".

Vocês acham que se os pilotos estivessem preparados para o vôo e soubessem que previa diversos níveis, e que isto tinha fortes razões de ser assim, e que de Brasília a Manaus, pela sua intepretação do diálogo mantido em S.José, estariam sendo autorizados a voar 3.490 km na contramão, eles não tentariam esclarecer esta autorização? Vocês concordam com o NTSB, conhecendo o diálogo mantido com a torre, que a rota estava "precisamente autorizada"? Os pilotos não só devem, mas são obrigados a rejeitar uma autorização que ponha em risco o vôo. Alguém tem alguma dúvida de que voar na contramão põe a aeronave em risco? Voar na contramão por 3.490 km nunca, em nenhum lugar do mundo, seria uma rota "autorizável". Vocês não concordam que os pilotos teriam a obrigação de saber que esta autorização era inaceitável. Ela seria descartada imediatamente por qualquer piloto com um mínimo de consciência situacional. Parece que a NTSB não concorda, e não se dá conta do absurdo que é alguém entender que foi autorizado a voar na contramão. Se alguém "mandou", tem que obedecer? Não, não é assim. Assim como os controladores "autorizam" os pilotos "aceitam" uma autorização. Se perceberem que a autorização põe em risco a segurança do vôo, por norma são obrigados a rejeitá-la. Se não rejeitaram é porque desconheciam completamente nosso espaço aéreo. Todos pilotos conhecem as normas:
"It is the pilot's responsibility to request an amended clearance if the pilot decides that the clearance ATC issued would cause deviation from a rule or regulation or place the aircraft in jeopardy".

Os pilotos têm a obrigação de conhecer as regras do espaço aéreo e portanto têm a obrigação de saber que voar no nível 370 de Brasília a Manaus era uma sentença de morte idependente de qualquer coisa que tivessem dito ou autorizado os controladores de vôo. Se os erros dos controladores foram grave, foram endossados pelos pilotos por ignorância do espaço aéreo brasileiro.

Além disso, todos devem entender que um plano de vôo é uma coisa muito séria. O plano de vôo do Legacy foi preparado por uma empresa altamente especializada, contém páginas e páginas de instrução. Prevê níveis adequados de vôo e velocidade ao consumo de combustível e às regras do espaço aéreo. É transmitido diretamente pelo sistema da empresa ao sistema de controle de vôo. Já escrevi e mostrei neste blog sua relevância, o imperativo de seu estudo e preparação pelos pilotos. Para que serve então todo este cuidado? Para botar no bolso, como fizeram os pilotos? Se a torre está autorizando algo completamente contrário ao requisitado, é preciso que se esclareça. Combustível e velocidade são determinados pelo plano de vôo, não se pode ir mudando assim sem mais nem menos sem por o vôo em risco. Onde estão os comentários do NTSB sobre mudanças de planos de vôos intempestivas e não justificadas? A mudança de um plano de vôo, da forma como estava sendo feita, comprometendo todo o planejamento é muito grave. Mas não se encontra uma palavra sobre isto nos comentários do NTSB, mais uma vez confirmando sua tendenciosidade.

Já mostrei também que o Departamento de Defesa americano (DoD), no Flight Information Publication (FLIP) de 2005, que contém dados aeronáuticos para planejamento de vôos, na seção sobre América do Sul já advertia:
“NOTE: Many South American countries use the term “Cleared Direct” to a fix when they mean for the pilot to fly via the flight planned route to the final destination or fix cleared to. Use caution when accepting a direct route to a fix, or query the controller as to his/her true expectations (TFMWG-CSA/TFMWG-CSA)”.

O DoD e todos os pilotos que voam no Brasil sabem disto, comprovadamente desde 2005, mas os pilotos do Legacy e a NTSB parecem que ainda não sabem.

Se os pilotos tinham em mãos um plano de vôo que previa diversos níveis, uma carta aeronáutica que mostrava claramente que de Brasília a Manaus (quase a travessia de um continente) voar no nível 370 era estar na contramão, mesmo assim não deveriam ter nenhuma dúvida em que altitude deveriam voar, como diz a NTSB? O diálogo com a torre foi esclarecedor? Não, as dúvidas dos pilotos ficaram explícitas após vermos o diálogo mantido entre Lepore e Paladino após a decolagem:
Paladino: All right, read the Oren departure and it wouldn’t give us an altitude.
Lepore: There wasn’t an altitude on there.
Paladino: I, I had a feeling it was going to be eight thousand feet ** what is it.
Lepore: And when we went to, to the tower, she immediately gave it to us. Uh, and just the verbalization of line up and take off.
Paladino: I, I had a feeling it was going to be eight thousand feet ** what is it and when we went to, to the tower, she immediately gave it to us. Uh, it’s just the phraseology like line up and take off.
Lepore: Line up and takeoff.
Paladino: Line up and wait.
Lepore: I like, asked twice ‘cause I don’t want to takeoff without, an opening.
Paladino: I as asked twice ‘cause I don’t want to takeoff without a clearance.
Lepore: Just get the # (fuck) out of here.
Paladino: I hate having the Brasilian Air Force on our ass.
Lepore: [I would] hate to have the Brasilian Air Force on our ass.

Este diálogo parece ser de uma tripulação que estava segura sobre o plano de vôo que tinha sido autorizado? Por que Paladino imaginou que o nível autorizado seria 380 se ele estava com o plano de vôo nas mãos prevendo níveis 370, 360 e depois 380? A resposta à dúvida de Paladino é porque ele sabia que a direção de S.José a Manaus é noroeste, e nesta direção e sentido os níveis autorizados são pares. Entretanto, de S.José a Brasília a aerovia é de mão única. Mas eles desconheciam nosso espaço aéreo, e se o conhecessem, saberiam que este plano vôo em um único nivel 370 não seria um plano "autorizável" e, portanto, inaceitável por estar clara e indiscutivelmente contrariando as regras das aerovias presentes na carta aeronáutica que estava nas mãos dos pilotos. As normas aeronáuticas dizem claramente:
“A pilot in command shall, if any time in doubt, request a detailed description of the route from Air Traffic Services (ICAO 7030/4/SAM RAC 5.1)”.

Onde estão os comentários da NTSB sobre isto? A orientação da NTSB é que os pilotos aceitem autorizações que contrariem as regras do espaço aéreo? Este é o cerne do problema. A ausência de reação dos pilotos. Se os controladores falharam, sim, é uma obrigação dos pilotos, que devem conhecer as regras do espaço aéreo zelar pela segurança do vôo. Isto se chama prudência, e sua ausência é uma das causas dos homicidios culposos.

A origem dos pilotos voarem no nível errado está neste diálogo de alguns minutos entre a tripulação e a torre nos minutos que antecederam a partida e mais nada. Vocês acham que a segurança de vôo pode ser posta em risco por diálogos desta natureza? Não, não pode.

Outro aspecto é que não há nada errado com sistemas de controle de tráfego e ele em nenhum momento contribui para o acidente. Não se pode raciocinar como se houvesse um plano de vôo solicitado e outro autorizado como comentado pelo NTSB. A análise do NTSB sobre as telas dos radares está técnicamente completamente equivocada e parte destes pressupostos equivocados, mas em breve voltarei ao assunto. O plano autorizado foi o solicitado e fornecido de forma errada. Para o controle de tráfego aéreo só existiu um único plano requisitado e autorizado.

Mas para concluir, o NTSB argumenta:
"Contributing to this accident was the undetected loss of functionality of the airborne collision avoidance system technology as a result of the inadvertent inactivation of the transponder on board N600XL”.

Para a NTSB houve uma não detectada falha de funcionalidade do TCAS através de um desligamento involuntário. Alô NTSB, Terra chamando: isto se chama negligência e imperícia!!! Os pilotos estão na cabine para operar e monitorar os instrumentos. Não houve uma falha de funcionalidade, houve um desligamento de um instrumento fundamental ao controle de vôo. Isto é imperícia. Por uma hora eles não olharam para o painel da aeronave. Isto é negligência. Como que isto pode ser considerado somente um fator contribuinte e não a principal causa do acidente? Não observar o painel da aeronave é uma falha menor? Ora tenhamos a santa paciência. Bastava uma olhada no painel PRIMÁRIO para ver "TCAS OFF". Pronto, não teria ocorrido a acidente. O transponder existe para que o controle de vôo possa controlar as aeronaves. Sem ele não há como controlá-las. Como se pode culpar o controle de tráfego, que cuida simultaneamente de cinco aeronaves cada controlador, por não agir em uma falha inimagínável da tripulação, se os pilotos além de desligar o transponder não olharam para o painel por uma hora!!! Para o NTSB, se os pilotos desligarem os motores inadvertidamente e não soar um alarme, isto seria um fator contribuinte e não a causa principal do acidente. A causa do acidente para o NTSB seria a aeronave ter se chocado ao solo. Para o NTSB os pilotos não tem responsabilidade de desligar o transponder, mas o controle sim por não avisá-los. Este comentário do NTSB desmorona qualquer argumentação de sua isenção diante dos eventos.

Não sei como uma organização como a NTSB é capaz de distorcer fatos tão claros. Basta que vocês reflitam sobre questões muito simples: (1) Admitindo-se que o controle de tráfego aéreo brasileiro tivesse “ordenado” que eles trafegassem 3.490 km na contramão, em completo desacordo com o seu plano de vôo, eles deveriam ter obedecido sem ter a menor reação? Qualquer piloto, desligaria os motores imediatamente e partia para a briga com o controlador. (2) Desligar inadvertidamente o instrumento mais importante de navegação aérea e não perceberam por uma hora é uma falha menor? Desta forma, vocês consideram a responsabilidade dos pilotos é mínima como nos quer fazer crer a NTSB?

Muitas outras considerações tendenciosas e absurdas estão presentes nos comentários da NTSB. Aguardem e farei mais comentários.

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Divulgado relatorio do Cenipa do acidente da Gol vôo 1907

Clique aqui para vê-lo.

Imprensa não entende a decisão do juiz e confunde leitores

A imprensa e os leitores, em conseqüência, não entenderam a decisão do juiz de Sinop, Murilo Mendes. O juiz ainda não julgou o processo. As notícias dizem que o juiz inocentou os pilotos de negligência, quando não foi nada disto (vejam a decisão do juiz no post anterior). A sua decisão foi simplesmente, durante a instrução do processo, descartar que houve negligência dos pilotos ao não comunicarem a falha de comunicação do transponder, uma das imputações feitas aos réus na denúncia do Ministério Publico. É claro que não poderia haver negligência de não comunicar a falha do transponder, se os pilotos nem mesmo perceberam que estava desligado, e muito menos que teria falhado. O sentindo desta denúncia pelos promotores foi de que, se o transponder eventualmente tivesse falhado, como alegam os pilotos, eles deveriam ter comunicado esta falha aos controladores de vôo. Teriam agido com negligência e imperícia em qualquer caso, na falha ou não do transponder. Portanto, não tendo os pilotos percebido uma eventual falha do transponder, como ficou comprovado pelo juiz durante as argüições, ficou prejudicada a denúncia por negligência em não tê-la comunicado.

Folha - 09/12/2008 - Familiares das vítimas do acidente da Gol repudiam absolvição de pilotos e controladores

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Pilotos do Legacy NÃO são absolvidos

Parece que os jornalistas precisam ter mais cuidado com suas notícias. Os pilotos do Legacy não foram inocentados, o que houve foi uma decisão saneadora do processo descartando denúncias que se mostraram inconsistentes na fase de instrução. Portanto trata-se de uma decisão parcial e sobre algo que pode ser considerado irrelevante da culpabilidade dos pilotos, cuja falha maior foi a de imperícia na operação dos instrumentos. Vejam a decisão do juiz:
[...] COM ESSAS CONSIDERAÇÕES: 1) ABSOLVO SUMARIAMENTE, DE MODO INTEGRAL, OS ACUSADOS FELIPE SANTOS DOS REIS E LEANDRO JOSÉ SANTOS DE BARROS. 2) DESCLASSIFICO, PARA A MODALIDADE CULPOSA, A CONDUTA ATRIBUÍDA A JOMARCELO FERNADES DOS SANTOS. 3) ABSOLVO SUMARIAMENTE O ACUSADO LUCIVANDO TIBÚRCIO DE ALENCAR RELATIVAMENTE ÀS CONDUTAS RELACIONADAS COM NEGLIGÊNCIA NO ESTABELECIMENTO DE COMUNICAÇÃO COM A AERONAVE LEGACY E COM NEGLIGÊNCIA QUE TERIA HAVIDO NA TRANSMISSÃO DE UM CENTRO A OUTRO. COMO A ABSOLVIÇÃO, NO PONTO, É PARCIAL, CONTINUARÁ O DENUNCIADO LUCIVANDO A RESPONDER À AÇÃO PENAL QUANTO À CONDUTA RELACIONADA COM OMISSÃO HAVIDA NA CONFIGURAÇÃO DAS FREQÜÊNCIAS NO CONSOLE. 4) ABSOLVO JAN PAUL PALADINO E JOSEPH LEPORE PELA CONDUTA RELACIONADA COM NEGLIGÊNCIA NA ADOÇÃO DE PROCEDIMENTOS DE EMERGÊNCIA QUANTO À FALHA DE COMUNICAÇÃO COM O "CENTRO". CONTINUARÃO OS DENUNCIADOS A RESPONDER PELAS DEMAIS CONDUTAS DESCRITAS NA DENÚNCIA. 5) DETERMINO A REMESSA DE CÓPIA DOS AUTOS AO PROCURADOR-GERAL DA REPUBLICA PARA QUE SUA EXCELÊNCIA AVALIE SE OS ELEMENTOS COLHIDOS PERMITEM, OU NÃO, O OFERECIMENTO DE DENÚNCIA CONTRA O SERVIDOR JOÃO BATISTA DA SILVA. PUBLIQUE-SE. APÓS, RETORNEM OS AUTOS PARA DELIBERAÇÃO SOBRE OS PEDIDOS DE PRODUÇÃO DE PROVA. Nº do Inquerito: 670/2006.
Vejam que é uma decisão parcial, ou seja, a situação dos pilotos continua a mesma, e além disso, ainda nem houve a deliberação sobre os pedidos de produção de provas e muito menos proferida a sentença, que está longe de acontecer.

Estado - 09/12/2008 - Pilotos do Legacy são absolvidos de negligência no caso Gol

Os fatos verdadeiros sobre o acidente da Gol

É importante que os leitores das últimas notícias sobre a iminente divulgação da apuração do acidente da Gol tenham suficiente senso crítico sobre o que está sendo divulgado pela imprensa, principalmente sobre a contribuição do controle de tráfego aéreo.

A liberação do Legacy na altitude incorreta

Como está sendo divulgado pela imprensa, a impressão que se tem é que o controle de tráfego aéreo teria “ordenado” que o Legacy mantivesse 37 mil pés até Manaus. Não é verdade. A torre de S.José dos Campos emitiu uma autorização utilizando uma fraseologia incorreta, que confirmava o nível do trecho inicial, em um formato extremamente comum no Brasil, omitindo o final da instrução que deveria terminar com “as filed” (autorizado conforme o plano de vôo). Isto levou a uma compreensão equivocada por parte dos pilotos, e que de certo modo, justificável, mas se estivessem preparados para o vôo, com certeza não aceitariam esta autorização e a colocaria em dúvida. Afinal, os colocava na contramão de Brasilia a Manaus. Ou seja, seguida ao pé-da-letra, os pilotos estariam corretos em sua interpretação, mas qualquer outro piloto teria entendido que estavam sendo liberados conforme o plano apresentado. A falta de familiaridade com o espaço aéreo brasileiro levou os pilotos a esta equivocada compreensão da autorização. Além disto, qual o sentido de receber um plano detalhado de vôo, prevendo diversos níveis durante o trajeto, e serem liberados com um nível único? Alguma coisa certamente estava errada. Esta é a razão do controle de vôo não perceber que o Legacy seguia um plano de vôo que existia somente na cabeça dos pilotos. Isto pode ser comprovado pela gravação da torre e pelas declarações dos controladores à CPI.

O controle de vôo não percebeu que o Legacy estava em rota de colisão

Os controladores não perceberam o risco porque não imaginavam que o Legacy voava na altitude de 37 mil pés. Primeiro, porque esta altitude era contrária às cartas aeronáuticas e segundo porque o transponder foi desligado inadvertidamente pelos pilotos. Para os controladores, portanto, tratava-se de um problema menor de comunicação envolvendo o transponder. Nem em sonho eles poderiam imaginar que o Legacy estava na contramão. E esta é a razão de não terem agido adequadamente diante desta situação de risco iminente. Segundo os controladores, ausência de sinais do transponder é uma situação muito comum já que a comunicação dele com o controle de tráfego aéreo é feita por meio de ondas de rádio e, portanto, constantemente sujeitas a falhas. Culpa-se o controle de vôo por não ter percebido esta situação, mas não se vê nenhum comentário sobre o transponder estar desligado por uma hora, sem que os pilotos observassem esta informação no seu painel PRIMÁRIO! Ou seja, a informação “TCAS OFF”, permaneceu atrás da tela do notebook que os pilotos estavam utilizando no seu colo para fazer cálculos de combustível este tempo todo! Ou seja, o controle não viu que o Legacy estava na contramão, mas muito mais grave, os pilotos não viram que o transponder estava desligado porque não olharam para o painel de comando. Se não o tivessem desligado, o controle teria verificado que estavam na altitude incorreta, e ai sim teriam sido tomadas outras ações diante de um risco concreto de colisão.

Estado - 09/12/2008 - O que diz o relatório da Aeronáutica sobre o acidente da Gol

domingo, 7 de dezembro de 2008

Relatório da Aeronáutica será divulgado na quarta-feira (10/12)

As últimas notícias dos jornais deste sábado dizem que o relatório final do acidente da Gol será divulgado na quarta-feira (10/12). Nenhuma novidade para quem acompanhou este blog todos estes meses.

Estado - 06/12/2008 - Um 3º avião atrapalhou comunicação na tragédia da Gol
Estado - 06/12/2008 - Piloto do Legacy desligou transponder no acidente da Gol
Folha - 06/12/2008 - Aeronáutica apresenta relatório final de acidente da Gol na quarta-feira
Folha - 06/12/2008 - Pilotos do Legacy desligaram o transponder, conclui Aeronáutica

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Justiça suspende o indiciamento de dez pessoas pelo acidente da TAM

Foi suspenso o indiciamento das dez pessoas apontadas pela Polícia Civil como responsáveis pelo acidente com o Airbus da TAM. Foi acolhida a argumentação dos advogados de dois dos acusados, de que haveria risco de duplo indiciamento, já que a Polícia Federal também apura as causas do desastre, mas ainda não concluiu seu inquérito. Agora, o delegado do caso deve apenas elaborar um relatório apontando as responsabilidades de cada um e remetê-lo ao Ministério Público Estadual (MPE). A decisão da Justiça era previsível. O indiciamento só foi decidido pelo promotor e delegado na semana passada, como uma forma de mostrar que a polícia tinha "feito sua parte" e dar uma resposta aos familiares das vítimas. A polícia e o Instituto de Criminalística não fizeram a sua parte, não. O trabalho da investigação técnica deveria apurar a exaustão que não houve uma falha mecânica e não só uma falha humana. Não foi possível comprovar que o manete estava efetivamente na posição “climb” como foi registrado pela caixa-preta. Isto sim, é fundamental para a apuração do acidente. Como não foi possível constatar a posição do manete, já que, segundo a Airbus (vejam o absurdo disso, o fabricante verificar se há um problema com seu produto!), ela foi tão danificada no acidente que nem através de uma tomografia foi possível comprovar sua posição. O juiz disse em seu despacho: "A inocência é que se presume, a culpabilidade precisa ser comprovada”. Como eu já disse, as notícias vinculadas a este inquérito mostram que ele era uma “pérola” de investigação. Se não foi possível comprovar que a pista contribuiu para o acidente, já que (1) o avião não aquaplanou; (2) o avião estava com as características de peso adequadas às condições da pista e (3) as normas técnicas de segurança admitem o pouso com o reverso pinado, como alguém pode ser indiciado por culpa da pista ou da aeronave? A argumentação do inquérito era que as condições da pista poderiam ter afetado psicologicamente o piloto e isto o fez esquecer de puxar o manete. Tenha a santa paciência!

Estadão – 25/11/2008 - Juiz suspende indiciamento de 10 pelo acidente da TAM.

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Inquérito do acidente da TAM indicía 10 pessoas

A perícia feita pelo Instituto de Criminalística sobre o acidente da TAM foi concluída e com base nela foram indiciadas 10 pessoas pela Polícia Civil. O inquérito foi concluído pelo delegado titular do 15º DP, que preside as investigações. Os indiciados são três funcionários da Infraero, cinco da ANAC e dois funcionários da TAM, Este inquérito é um atentado a inteligência de qualquer um e só se presta para justificar as obras absurdas de ampliação do aeroporto de Congonhas.

Os culpados são a ANAC e a Infraero por terem liberado a pista, mas sem nenhuma surpresa, a mesma perícia concluiu que a aeronave não aquaplanou e, portanto, as condições da pista não contribuíram para o acidente. A TAM é culpada por permitir uma aeronave com o reverso pinado, entretanto, as normas técnicas fornecidas pelo fabricante do avião não coloca nenhum impedimento para pousos com reverso pinado sob as condições vigentes no momento do pouso. Ou seja, não contrariou nenhuma norma técnica de segurança. Todos os dias dezenas de aviões continuam a pousar e decolar no mundo todo com reversos pinados, mesmo sob chuva e em pistas curtas. Bastam os pilotos seguirem os procedimentos corretos.

Por outro lado, a investigação conduzida pela Aeronáutica afirmará não ser possível esclarecer a principal dúvida do acidente: foi por erro dos pilotos ou do equipamento que na hora do pouso o manete da turbina direita estava em posição de aceleração? Segundo o relatório final da FAB, que só será divulgado em 2009, será inconclusivo neste ponto, segundo o que informam os jornais. Após a realização de um sofisticado exame no quadrante de manetes através de uma tomografia em três dimensões não foi possível apontar em que posição estava o manete direito. A peça foi quase que integralmente derretida pelo fogo. A caixa-preta de fato registrou a informação de que o manete estava na posição de "climb", quando no pouso deveria estar na posição neutra ou reverso. Quanto a isso não há dúvida. O que a perícia poderia esclarecer é se isso aconteceu porque os pilotos esqueceram de mudar a posição do manete ou se o computador de bordo não obedeceu ao comando. Não há como responder a essa pergunta, dirá o relatório, e é esta a resposta que todos nós esperávamos.

Tem muita gente que está adorando este inquérito, porque graças a eles vão encher os bolsos com suas polpudas comissões sobre as obras que serão feitas para a ampliação de Congonhas. Só me surpreende que o Padre Anchieta também não tenha sido indiciado, já que foi ele que fundou São Paulo, onde se situa Congonhas e, portanto, é o culpado por tudo que aconteceu depois disso.

Folha - 19/11/2008 - Laudo responsabiliza dez pessoas pelo acidente da TAM.
Folha - 15/11/2008 - Laudo da Aeronáutica sobre acidente com Airbus será inconclusivo.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Laudo do IC do acidente da TAM já foi concluído

As notícias dão conta que após 16 meses de investigação, o Instituto de Criminalística (IC) de São Paulo finalizou nesta semana o laudo sobre o acidente com o Airbus A320 da TAM. Segundo os jornais, as conclusões focam nas falhas administrativas cometidas principalmente pela cúpula e por altos funcionários da Anac, além de identificar erros por parte da Infraero, da TAM, dos pilotos do avião e até do fabricante do jato. Os envolvidos deverão ser enquadrados no crime de atentado contra a segurança de transporte aéreo (artigo 261 do Código Penal).

Segundo a notícia do Estado, os pilotos, que foram apontados inicialmente como os maiores responsáveis pelo acidente tiveram sua responsabilidade relativizada no laudo. O laudo diz que não houve quebras ou falhas de equipamentos e sistemas eletrônicos da aeronave, indicando que foi um equívoco no manuseio dos manetes que levou o jato a varar a pista do Aeroporto. Os peritos, no entanto, mostram que várias informações repassadas durante o vôo entre Porto Alegre (RS) e São Paulo (SP) podem ter influenciado psicologicamente os pilotos. Um desses dados dizia respeito às condições da pista. Minutos antes do pouso, conforme registrado pela caixa-preta de voz, um controlador chama a atenção para o asfalto “molhado e escorregadio”. Ao fundo, é possível ouvir até mesmo um dos comandantes repetindo a fala do controlador, como se tentasse reforçar a informação para si mesmo. Afinal, o avião estava lotado e os tanques estavam cheios de combustível. Os investigadores do IC acreditam que a decisão dos pilotos de manusear os manetes de maneira diferente da recomendada pela TAM (sic) tem a ver com uma possível “ansiedade” deles em realizar o pouso. O “stress emocional” a que os comandantes estavam submetidos e esse excesso de zelo na fase final do pouso podem ter contribuído para a tragédia (sic).

As notícias sobre este laudo, mostram que ele será uma verdadeira “pérola” da investigação de acidentes. A começar pela quantidade de “falhas” apontadas e que contribuíram para “stress” do piloto. Provavelmente apontará que os bancos do avião também não foram limpos adequadamente e isto deixou os pilotos perturbados. Havia também uma lâmpada queimada na pista e isto também pode ter desviado a atenção dos pilotos. Ou seja, todo e qualquer tipo de problema que existe no mundo passa a ser um fator contribuinte do acidente e alguém deve ser incriminado por perturbar psicologicamente os pilotos.

Ora, haja paciência! As investigações sobre os acidentes aéreos têm que ter um mínimo de inteligência e racionalidade! Agora vão dizer que se o avião não tivesse pousado em Congonhas e se S.Pedro não tivesse mandado a chuva, não haveria o acidente! O que precisa ser apontado pelo Instituto de Criminalística é o que provocou o acidente e ponto final! Análises da causa de um comportamento não competem a um laudo técnico, ele deve estar restrito a descrever o comportamento que provocou o acidente e não levantar hipóteses para o que provocou este comportamento. Sabe-se lá se o piloto estava “stressado” por uma dívida que ele tinha ou por um problema familiar? Qualquer hipótese de causas “psicológicas” não pode ser motivo de um laudo técnico de apuração de acidente, nem ao menos fazer parte de um inquérito policial. Isto é ridículo!

Ou seja, o que deve ser apurado é qual foi a ação de algum agente ou evento material, como a falha de equipamentos, que provocou o acidente e se isto feria alguma legislação ou norma técnica. Dizer que o acidente ocorreu porque a pista estava molhada, que a pista é curta, que o reverso estava pinado, que não havia grooving é tautológico! O que deve ser apontado, portanto, é se alguns dos seguintes fatores contribuintes feriu alguma norma técnica de segurança:

1. Reverso pinado. Sabemos que as normas permitem pousos com reversos pinados sobre aquelas condições atmosféricas, pista e aeronave. Centenas de pousos já foram feitos com reverso pinados sobre aquelas condições. Se reversos pinados provocassem acidentes, já teriam sido proibidos. Lembre-se que no recente acidente do MD-82 em Barajas o reverso estava pinado, e isto não teve qualquer papel no acidente. Se as normas técnicas permitem o pouso com o reverso pinado sob determinas condições, não se pode culpar ninguém quando as seguem, poderia-se sim, culpar quem elaborou as normas técnicas, o que é uma discussão que se daria em outra esfera;
2. Pista sem grooving. Sabemos que as normas permitem pousos em pistas sem grooving sobre estas mesmas condições. O grooving só tem um efeito positivo na frenagem sob chuvas intensas, em outras situações ele não tem função nenhuma. Nas condições em que a pista estava ficou evidente que não foi um fator contribuinte. O avião não aquaplanou, e isto já foi apurado pelos registros da "caixa-preta", portanto, não se pode culpar a ausência do grooving pelo acidente e, portanto, não se pode culpar ninguém por permitir o pouso numa pista sem grooving.
3. Extensão da pista. Ainda hoje temos no mundo aeroportos importantes com pistas curtas e cercadas pela malha urbana. Vejam os exemplos já exaustivamente citados aqui do aeroporto Midway de Chicago e Regan de Washington. Portanto, a extensão da pista de Congonhas é adequada para as condições dos aviões que pousam lá. Se não o fosse, hoje mesmo deveriam ser proibidos os pousos sob aquelas mesmas condições, não só em Congonhas, como em todas as pistas do mundo com mesma extensão. Se não o são, e estes aeroportos estão abertos a pouso e decolagens de aviões em condições equivalentes às que haviam na ocasião do acidente, é porque são adequadas ou o mundo todo está errado.

Enfim, o laudo deveria apontar se as condições do pouso feriram alguma norma de segurança vigente. Sabemos categoriacamente que não, assim como sabemos que centenas de pousos estão sendo feitos sob condições semelhantes em muitos lugares do mundo neste exato momento. Portanto só resta uma discussão e só esta deve ser profundamente analisada: não deveria restar a menor dúvida se posição do manete estava efetivamente em “climb” ou se isto foi o que ficou registrado na “caixa-preta”, mas por uma eventual falha mecânica teria registrado este evento sem que tenha sido esta efetivamente a intenção do piloto. Sobre isto não poderia restar a menor dúvida, e esta deveria ser o resultado da investigação. Outra questão que deveria ter sido investigada é o treinamento que o piloto teve para esta situação: ele estava adequadamente preparado para este tipo de pouso? Qualquer outra discussão é besteira.

Estado - 14/11/2008 - Perícia aponta falhas de TAM, piloto, pista e Anac em acidente.
Estado - 14/11/2008 - Inquérito sobre o vôo 3054 aponta 10 responsáveis.
Estado - 14/11/2008 - No pouso, piloto errou posição de manetes do Airbus.
Estado - 14/11/2008 - Laudo do IC destaca 'stress' da tripulação do vôo 3054.
Estado - 14/11/2008 - Laudo do acidente da TAM aponta erros sucessivos.
Estado - 14/11/2008 - Laudo do IC diz que não houve falha de equipamento.
Estado - 14/11/2008 - Anac rebate IC e diz que cumpriu regras de segurança.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Jobim, Kassab e Serra acham que a população é idiota

Nelson Jobim se junta a Kassab e José Serra para tentar fazer a população de São Paulo de idiota. Reuniram-se para discutir um projeto de ampliação do aeroporto de Congonhas, com extensão da pista no sentido Jabaquara em aproximadamente 1.100 metros. Segundo informam algumas notícias, este projeto teria sido feito pela prefeitura a pedido do Lula. Segundo Kassab, a obra deverá ter um custo aproximado de R$ 400 milhões com desapropriações. Se o valor das desapropriações é este, imaginem o custo das obras de terraplanagem para cobrir o "buraco" no Jabaquara. Ele tem a cara-de-pau de afirmar que a Prefeitura não deve encontrar resistência para as desapropriações porque a maioria dos moradores quer se mudar da região por questões de segurança. "A região está a favor do projeto, 80% da população está disposta a sair de lá". Ainda acreditando na nossa estupidez, dizem que a ampliação da pista não deve implicar aumento da capacidade de vôos em Congonhas, mas deverá ser feita simplesmente por questões de segurança. "Congonhas está no limite", afirmou o ministro Jobim. Mas parece que o que não tem limite é o desejo destes políticos enganarem a população.

Vejam bem, se o problema fosse de segurança, a solução é extremamente simples: reduzam os limites admissíveis de peso dos aviões. Pronto, o problema estaria resolvido de imediato. A pista de Congonhas tem 1.940 metros e a pista do Santos Dumont apenas 1.400 metros, portanto, se há um problema de segurança em Congonhas, é muito maior lá. Estão debatendo no Rio como irão pavimentar o mar? Por que não se fala nada da segurança do Santos Dumont? Porque lá são aplicadas as restrições de peso das aeronaves, assim como atualmente são aplicadas em Congonhas, e lá não estão pretendendo aumentar a capacidade do Santos Dumont. Esta turma está trocando as bolas para confundí-lo. A extensão da pista é a maior que as condições topográficas e do entorno permitem, e depois, segundo padrões de segurança aceitos mundialmente, determinam-se os aviões que podem nela operar e com quais restrições. Qualquer combinação de avião/peso opera nos limites de segurança admissíveis. Em pistas maiores operam aviões maiores, com cargas maiores. Por exemplo, não se operariam Airbus e Boeings no limite de suas cargas no Campo de Marte, que tem uma pista de apenas 1.600 metros, e depois se diria para a imprensa que o Campo de Marte é inseguro e seria necessário ampliá-lo! Isto beira ao delírio! A cada pista podem ser operados os aviões em que a segurança não seja comprometida, isto é óbvio!. Por este raciociocínio estariam comprometidas a segurança dos aeroportos Midway de Chicago e Regan de Washington que também contam com pistas de apenas 2.000 metros.

Portanto, o problema não é de segurança, como estão afirmando, e o que eles estão querendo é sim o aumento da capacidade de operação em relação à situação atual. Eles querem operar com aviões mais pesados e maiores e isto é uma forma de aumentar a capacidade de Congonhas.

Agora, a maior estupidez está no que o Kassab diz ao afirmar que a população está disposta a sair de lá. Pois bem, ele diz que a população que foi morar lá depois da construção do aeroporto, agora se arrependeu, está com medo e está disposta a se mudar. Mas o que vai acontecer com a população que hoje está a 1.100 metros distante da cabeceira e vai ficar colada na cabeceira depois da ampliação? O que vai achar esta população? Muito agradecida a Kassab, sem dúvida. Agora perguntem a esta população que atualmente mora nas cabeceiras de Congonhas se eles preferem que diminuíssem o número de vôos, capacidade e tamanho dos aviões para aumentar a segurança ao invés de serem desapropriados. O que vocês acham que eles dirão?

Não adianta esconder o sol com a peneira. Estes políticos estão querendo mesmo é ampliar a capacidade de Congonhas, agravando ainda mais a situação da população do entorno do aeroporto, simplesmente para atender a pressão das companhias aéreas e ao mesmo tempo receber suas polpudas comissões destas obras faraônicas. Para isto escondem as suas verdadeiras intenções sob o véu do discurso da segurança, porque isto comove a população, amedrontada após o acidente da TAM.

O que a população de São Paulo quer, ao contrário, é o bom senso da redução da capacidade de Congonhas, com aviões menores e mais silenciosos para atenderem somente o tráfego regional, como o que foi e continua sendo feito em inúmeras outras cidades em que os aeroportos se viram cercados pela malha urbana. Não faz sentido Congonhas operar conexões e ter vôos para todo o Brasil. A tendência em todos lugares do mundo não é tirar a cidade à volta do aeroporto e sim diminuir a sua capacidade.

Folha Online – 03/11/2008 - Ampliação de Congonhas deve custar R$ 400 milhões em desapropriações.

Estadão - 04/11/2008 - Ampliação de Congonhas é analisada em Brasília.

sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Avião quase vai parar no mar das Ilhas Canárias

Hoje, um Boeing 737 da companhia Air Europa ultrapassou o final da pista no aeroporto da Ilha Canária de Lanzarote ao aterrissar. Se fosse no Brasil, estariam todos questionando: por que não construiram uma área de escape, mesmo que virtual, como a que fizeram em Congonhas? Alguns teríam propostas para criar um viaduto sobre o mar. A Veja questionaria, por que não foi feita uma área de escape de concreto frágil? Nós, brasileiros, somos mesmo muito criativos nestes aspectos. De qualquer forma, a culpa seria da crise aérea.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Companhias aéreas americanas lucram na América Latina

O Wall Street Journal publicou um artigo nesta semana mostrando a expansão dos planos de investimentos das companhias aéreas americanas para a América Latina, impulsionados pelo crescimento significativo do número de passageiros desta região. Parece que a campanha de Joe Sharkey contra o controle de tráfego aéreo brasileiro e a crise aérea brasileira não têm assustado as companhias americanas.

Devido a crise econômica deste ano, que tem atingido todo o globo, as viagens aéreas internacionais diminuíram em todos os lugares exceto em uma região: a América Latina. Mesmo que este mês os mercados de moedas e ações da região tenham caído em queda livre e as exportações da América Latina tenham se reduzido, as companhias aéreas continuaram a ter um bom desempenho por aqui. O crescimento das receitas da American Airlines e Continental Airlines na América Latina, duas das operadoras com os maiores alcances na região, ultrapassou o de todas as outras rotas internacionais no terceiro trimestre deste ano.

A American Airlines está entre as companhias americanas que estão lançando novos vôos para a América Latina. No próximo mês vai lançar novos vôos para o Brasil, “a região da maior e mais promissora economia [sic]”, com percursos servindo Recife, Salvador e Belo Horizonte. A Delta também tem planos de incluir rotas para cidades no Brasil, Argentina, Colômbia, Equador e Honduras em dezembro.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

US Today apura que desde 2000, 55 aeronaves tentaram decolar sem os flaps estendidos

O jornal US Today publicou o artigo Human error stubborn snag in airline safety, no qual informa que do ano 2000 até agora, foram notificados 55 casos de aeronaves que tentaram decolar sem extender os flaps. Este fator é o que está sendo apontado como a causa do acidente da Spanair em Barajas. Acrescenta que em quase todos os casos o sinal de alarme funcionou adequadamente e previniu as trajédias. Se simplesmente não estender os flaps provocasse acidentes, teríamos neste período mais 55 tragédias nos EUA.

Desde o início, quando as análises preliminares apontaram que os flaps do MD-82 não haviam sido estendidos, eu dizia que este fator contribuinte isolado não poderia ser apontado como a única causa do acidente, outros fatores precisariam ter contribuido para o acidente. Agora já se sabe que os alarmes de flaps não estendidos não soaram, ...mas alguma coisa mais deve ter acontecido. Diz o jornal que em "quase" todos os casos o sinal de alarme funcionou adequadamente. O que aconteceu então nos outros casos nos quais no houve acidentes? Será por que os pilotos reagiram apropriadamente aos alarmes de stall? Estes sim, foram ouvidos na gravação da cabina. Por que o piloto da Spanair não consegui reagir à esta situação, mesmo em uma pista longa e sem obstáculos nas laterais da pista? As explicações ainda não estão completas.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Juiz espanhol indicía mecânicos e chefe de manutenção pelo acidente de Barajas

(atualizado em 16/10-16:15)

El País - 16/10/2008 - El juez imputa a dos mecánicos y al jefe de mantenimiento de Spanair por homicidio y lesiones imprudentes

O juiz Javier Pérez, a frente da investigação do acidente da Spanair irá indiciar por homicídio e lesões corporais culposas os mecânicos que efetuaram a revisão do avião antes do acidente e o chefe de manutenção da companhia aérea. As investigações até agora apontam que a causa do acidente foi o não acionamento dos flaps e slats. O alarme não foi ativado porque o avião estava no modo vôo e, portanto, não estava bem configurado, algo que não foi detectado pelo mecânico que revisou a aeronave.

Isto é o que está sendo apresentado pela imprensa espanhola, mas a mim causa um pouco de estranhesa pelo meu desconhecimento do ritual processual espanhol. No Brasil, as autoridades policiais (entenda-se os delegados) fazem as investigações; entregam o inquérito policial para o Ministério Público (poder judiciário) e o promotor, se encontrar elementos no inquérito que justifiquem a ação penal, oferecem denúncia, que será aceita ou não por um juiz. Sendo aceita, dará início ao processo judicial. Tudo isto, ocorrendo em paralelo à apuração das autoridades técnicas (entenda-se as autoridades aeronáuticas). No Brasil, quem estaria à frente das investigações seria um delegado e quem ofereceria a denúncia seria um promotor. As duas investigações (criminal e técnica) não se confundem em seus objetivos: a primeira verifica se houve negligência, imperícia ou imprudência. A segunda, o que provocou o acidente e como poderia ser evitado, sem entrar no mérito da responsabilidade criminal. Mas é claro que a primeira terá que ser apoiada pelas investigações técnicas para que possa atribuir responsabilidades.

De qualquer forma, meu objetivo é mostrar que mesmo na Espanha, já se iniciou um processo de investigação criminal, mesmo não havendo nenhuma conclusão da investigação técnica dos organismos de apuração de acidentes aeronáuticos.

Como vocês podem ver, em qualquer lugar do mundo, quando há fatalidades nos acidentes, mesmo aeronáuticos, iniciam-se as investigações criminais. Isto não significa que os mecânicos sejam culpados, trata-se apenas de uma investigação já que há fortes indícios de imprudência, como houve nos acidentes brasileiros.

Será que Joe Sharkey, neste caso, protestaria contra estes procedimentos? Será que os aeroviários invocarão o Anexo 13 para a não criminilização das investigações? Certamente irão, mas não vai adiantar nada, porque a justiça na maior parte do mundo democrático é assim. E deve ser assim.

terça-feira, 14 de outubro de 2008

Viúva de vítima do acidente da Gol processa Joe Sharkey

Globo – 14/10/2008 - Viúva de vítima do acidente da Gol processa passageiro do Legacy

Os advogados de Rosane Gutjhar, viúva de Rolf Ferdinando Gutjhar, uma das vítimas do acidente do vôo Gol 1907, protocolaram uma ação por danos morais contra Joe Sharkey. Segundo a ação, o jornalista teria influência na mídia e teria lançado uma campanha em seu blog na internet em prol dos pilotos do jatinho. O objetivo do jornalista, ainda de acordo com os advogados da viúva, seria o de comover a população dos EUA a impedir o retorno dos pilotos ao Brasil.

Extremamente correta e corajosa a atitude desta senhora, que neste momento de dor ainda sofre com a insensibilidade, jogo de interesses e mau caratismo deste jornalista.

sexta-feira, 10 de outubro de 2008

Publicado relatório preliminar do acidente de Barajas


A Comissão de Investigação dos Incidentes a Acidentes da Avidação Civil (CIAIAC) da Espanha publicou o relatório preliminar do acidente do MD-82 da Spanair em Barajas-Madrid.

Relatorio (PDF em espanhol)

O relatório, que se concentra nas informações técnica sobre a aeronave, indica que durante todo o procedimento de decolagem até o final da gravação não se registrou nenhum som na gravação da cabina relacionado com o alarme de decolagem. Outra diferença em relação aos informes preliminares conhecidos através dos meios de comunicação há duas semanas: os pilotos realizaram a lista de conferência (check list) e disseram "flaps, slats, ok", segundo fontes da comissão.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Até hoje, nem a ABCTA entendeu o acidente da Gol

Parece que até hoje nem mesmo a ABCTA – Associação Brasileira de Controladores de Tráfego Aéreo – entendeu o acidente da Gol vôo 1907. Publicou o artigo NOTA - 29 de setembro de 2006: Jamais Esqueceremos! no qual afirma sobre as investigações do acidente : “Em nenhum momento foi feita uma declaração de que a mudança automática dos níveis de vôo autorizado pelo solicitado pode induzir o controlador ao erro, no entanto ouvimos exaustivamente que o sistema não falhou, mas sim o homem, como se o mesmo não fizesse parte do sistema”. Estão se referindo à indicação da tela do radar que poderia ter induzido o controlador ao erro. Primeiro ficou claro em toda a investigação que não houve um plano “solicitado” diferente do “autorizado”. O plano autorizado foi efetivamente aquele que foi solicitado, entretanto por utilização de uma fraseologia não usual, fora das normas internacionais, mas comum no Brasil, os pilotos entenderam um plano de vôo autorizado diferente do solicitado. Portanto, em nenhum momento o sistema fez uma “mudança automática dos níveis de vôo autorizado pelo solicitado”. Vejam abaixo a imagem da tela do radar nos momentos que antecederam o acidente, logo após passar a vertical de Brasília.


No lado esquerdo é informado o nível real identificado pelo radar (348). Neste caso o número é impreciso porque o Legacy voava sem o transponder ativado. O controlador sabe disto claramente pela indicação “Z” que se segue. Do lado direito é meramente uma indicação do nível de vôo do plano de vôo solicitado, e que foi o autorizado. Se o plano de vôo autorizado fosse 370, aqui apareceria 370. É uma indicação de qual é o nível real e o nível autorizado. Uma indicação de uma aeronave voando proximo ao Legacy com o transponder ativado mostra o nível real (380) o nível autorizado (380) e a indicação que o transponder está ativo (=). Não há nada errado neste sistema! É uma questão de projeto, como poderiam ser adotadas outras soluções, basta os envolvidos saberem e serem treinados para seu significado.

O que ocorre a partir destes momentos é que o controlador subavaliou a gravidade do problema e a existência de um risco de colisão. Para ele havia um problema menor da falha do ajuste do transponder ou até com a sua recepção, algo comum em qualquer equipamento de comunicações e que os controladores estão habituados. Equipamentos que envolvem comunicações por rádio não são 100% estáveis, não tem jeito, o ser humano ainda não inventou a comunicação perfeita. Ele não imaginava que o Legacy voava no nível 370! Este inexistente plano “autorizado” só existiu na imaginação dos pilotos pela autorização verbal em S.José dos Campos dada usualmente no Brasil fora das normas internacionais. Por isto a falta de iniciativa do controlador. Como ele poderia imaginar que uma aeronave estaria em um nível impar na UZ6 em direção a Manaus! As falhas dos controladores foram utilizar uma fraseologia fora das normas internacionais para autorizar o vôo em S.José dos Campos, o que induziu os pilotos ao erro, além da sua falta de ação diante de uma tela de radar que apresentou por uma hora a indicação que o transponder estava desativado.