terça-feira, 15 de julho de 2008

Ainda sobre a apuração do acidente da TAM

Os noticiários sobre as conclusões do acidente da TAM mostram que as apurações dos acidentes são direcionadas para atender os clamores da população e da mídia em apontar a crise aérea como culpada pela tragédia ao invés de analisar racionalmente o que aconteceu e assim evitar novos acidentes desta natureza.

O promotor criminal Mário Luiz Sarrubbo declarou a imprensa que “Dentre os vários fatores que contribuíram [para o acidente], um deles seria o equívoco do posicionamento do manete de aceleração, levando em consideração o sistema inseguro que naquela oportunidade se apresentava” e que vê indício de culpa grave em “sete a dez pessoas”. O delegado encarregado do inquérito confirmou que o mal-posicionamento dos manetes foi determinante para a ocorrência do acidente. Portanto não resta dúvida alguma sobre a causa do acidente, ou seja, bastava o manete estar posicionado corretamente, algo banal para um piloto experiente, para que a tragédia não ter acontecido e o pouso ter o mesmo sucesso de milhares de outros nas mesmas circunstâncias. Ou seja, bastava frear (aerodinamicamente) o avião para ele ter parado normalmente.

Mas o delegado acrescenta algumas pérolas: “que o exame que liberou as operações naquela pista sob chuva pouco mais de uma hora antes do acidente foram superficiais; e que a pista não tinha o "grooving" -- ranhuras no asfalto -- previsto no projeto original. Nosso entendimento é o de que o acidente era totalmente previsível. Nós temos relatos de pilotos, por exemplo, que receberam autorização para pouso em Congonhas e que, depois de verificarem visualmente o estado da pista, resolveram por iniciativa própria não pousar ali. E não foi só um caso, foram quatro ou cinco".

Diz que a ausência do “grooving” contribui para o acidente, mas não diz como. Sabemos que não houve aquaplanagem e, portanto, derruba qualquer argumentação sobre o papel do grooving neste acidente. Lembre-se: grooving evita aquaplanagem e, ao contrário do que se diz, diminui o atrito entre pneus e pista e não o contrário, portanto, se a pista tivesse grooving, evitaria aquaplanagem. Mas o avião não aquaplanou, portanto a ausência de grooving não contribuiu para a tragédia.

Diz ainda que o acidente era previsível. Como assim? Os pais-de-santo e videntes teriam lhe dito que o piloto colocaria o manete na posição errada? Ou será que sempre que um piloto está sob stress é previsível que ele posicione o manete errado?

Acrescenta que outros pilotos desistiram de pousar por iniciativa própria. Parece que o delegado não tem a menor intimidade com a aviação. Moro ao lado de Congonhas, e qualquer um que conheça um pouco de aviação, ou more ao lado de um aeroporto, verá que diariamente vários aviões arrementem depois de posicionarem incorretamente suas aeronaves, ou no momento o vento ser excessivo ou com muita variação, a chuva ou neblina intensificar, tráfego intenso de aeronaves, etc., etc. Ou seja, esta é uma situação absolutamente rotineira. Pilotar um avião, dirigir um carro, ou qualquer condução de veículos é uma atividade de risco. Sempre envolve avaliações e decisões individuais. Cada ser humano tem diferentes atitudes em face ao risco, dizer que um está certo e outro errado é fácil depois do evento. Quem pode afirmar que os outros pilotos não agiram com exagero? Além disto, porque concluíu o delegado que o piloto não deveria ter pousado? A decisão de pousar foi errada? As circustâncias que fizeram os pilotos não pousar eram as mesmas do pouso da TAM? Qual foram os especialistas em aviação que concluiram que o piloto não deveria pousar? As dezenas de aviões que pousaram nos minutos que anteceram este acidente, estavam errados então?

Portanto o que se vê é delegados, promotores, imprensa e políticos abandonar a obviedade da causa do acidente, o posicionamento incorreto do manete, para tecer análises psicológicas do piloto, tentando justificar seu comportamento, como se estivessem preparados para isto. Concluem que o stress provocado pela crise aérea, a pista escorregadia (como se alguma pista não fosse escorregadia em dias de chuva), e a ausência de grooving, deixou o piloto tão transtornado que ele posicionou o manete na posição errada. Quem pode garantir que o piloto não cometeu o erro por um problema pessoal, por simples distração ou por falha sua ou da companhia no treinamento? A questão fundamental nesta apuração é saber qual o treinamento que o piloto teve para pousar com o reverso pinado. Se não foi treinado já temos uma causa identificada para seu comportamento. Se foi treinado, e parece que foi, pois havia feito outros pousos com o reverso pinado, nunca saberemos porque agiu desta forma, pois o ser humano não é uma máquina que para cada ação sabemos a causa.

Agora, toda vez que um motorista provocar um acidente em uma estrada por excesso de velocidade, ele irá alegar que as condições precárias da estrada, o custo do pedágio, a situação política do país, o custo dos alimentos, a família em crise, o veículo sem manutenção, o fez esquecer o pé em baixo no acelerador.

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