O acidente no aeroporto de Barajas com o MD82 da Spanair faz-nos refletir sobre as limitações da tecnologia e da engenharia e que ainda é difícil para as pessoas, em geral, aceitarem. O aeroporto de Barajas, e seu Terminal 4, ao qual já estive várias vezes, é um dos mais modernos do mundo. O que me impressionou neste aeroporto, além da modernidade do terminal, é claro, foi o tamanho das pistas e o relevo suave e desimpedido ao seu redor. Mesmo após o término dos seus 4.350 metros de pista, prolongam-se áreas de escape por centenas de metros, embora nas laterais haja alguns barrancos e mesmo riachos, no qual, em um deles, parou o avião acidentado. Sob o ponto de vista do aeroporto, nada se pode dizer que tenha contribuído para o acidente. Pelo contrário, é até possível que pela extensão da pista, o piloto, diante da falha de um dos reatores, tenha optado por abortar a decolagem. Esta aeronave saem do solo em pouco mais de 1.000 metros (requerem pistas de 1500m a 2500m, segundo o pêso e outros fatores) e, portanto, com estas dimensões de pista é perfeitamente possível que o piloto possa ter optado por permanecer no solo. Então, as discussões voltam-se para a manutenção da aeronave. Como o avião apresentou algum problema antes da decolagem, que o fez adiar a sua partida por uma hora e meia, isto está sendo associado como a causa do acidente. Devemos aguardar a apuração antes de qualquer conclusão precipitada, assim como no acidente da TAM em Congonhas. Primeiro porque é necessário verificar se o defeito apresentado antes da decolagem foi o que provocou o problema com o motor. O sobreaquecimento que foi identificado, e que atrasou o vôo, pode ser simplesmente um problema em um gerador, ou ar condicionado, ou em qualquer outro equipamento não associado à queda. Também já é apontada como provável causa do acidente a idade do avião. É incrível como o ser humano não aceita que a sua tecnologia está sujeita a limitações. Se há uma falha mecânica é porque falhou a manutenção. Não é bem assim. A resistência dos materiais tem um padrão estocástico, ou seja, nunca se sabe a que carga os materiais resistirão à ruptura. Se for analisada uma amostra de barras de ferros exatamente iguais, cada uma se romperá com uma carga diferente, com uma distribuição normal em torno de uma média prevista. Em um conjunto extremamente grande de barras de ferro, algumas romperão com cargas extremamente baixas sem que se possa perceber antecipadamente. Um conjunto de parafusos submetido a uma mesma vibração irão “desapertar” em momentos diferentes. Os materiais não são exatamente homogêneos, mesmo metais possuem bolhas e fissuras microscópicas não perceptíveis a olho nu. Não se podem adotar os materiais de máxima resistência sem contrapô-los ao seu peso. Se em um avião, por exemplo, os materiais fossem escolhidos para não se romperem nunca, eles não sairiam do solo pelo seu peso. Assim as peças de um avião têm uma probabilidade infinitesimal de se romperem, mas mesmo assim, esta probabilidade está lá. Em alguns raros casos se transformarão em acidentes. Grande parte da manutenção dos aviões é preventiva, ou seja, trocam-se periodicamente as peças que sofrem desgaste. Aquelas que não estão submetidas a desgaste não são trocadas. Há milhares de peças em um avião que nunca serão trocadas, não faz sentido. Uma peça não submetida a desgaste pode-se romper com algumas horas de uso ou nunca se romper em toda sua vida. Não faz sentido trocar peças por trocar. Além disto, as causas dos acidentes são extremamente complexas, e raramente são simples falta de manutenção. Em geral é a combinação de inúmeros fatores contribuintes que se somam. Por exemplo, um pequeno pedaço de borracha solto por uma aeronave em uma pista, que entra em uma turbina, que provoca um imperceptível deslocamento de uma peça, que passa a produzir uma pequena vibração, que depois de muito tempo vai soltar um parafuso, que por fim provocará a explosão do reator. Os acidentes são sempre assim. Como culpar alguém, uma pessoa, uma empresa, uma organização, por um evento assim? Temos que procurar sempre, as causas dos acidentes, e evoluir constantemente na tecnologia empregada, mas temos que reconhecer que ainda vão levar décadas ou séculos até o ser humano não estar sujeito às limitações da sua tecnologia. Vamos aguardar a apuração deste acidente, antes de qualquer conclusão precipitada.
Nota: notícias detalhadas deste acidente podem ser encontradas nos jornais El Mundo e El Pais
quinta-feira, 21 de agosto de 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário