quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

IFATCA e NTSB têm muito que aprender sobre sistemas informatizados

É paradoxal como as organizações que representam os controladores de vôo ainda insistem em assumir a culpa no acidente da Gol, quando claramente a sua responsabilidade foi mínima. A ausência de uma atitude firme destas organizações, principalmente as internacionais, é o que tem contribuído para a imprensa em geral a eles imputar a responsabilidade pelos eventos. Não sei o que pode estar por trás desta atitude. O principal ponto em que se fundamentam é que as informações que são apresentadas nas telas dos consoles dos radares tenham confundido os controladores por apresentar a altitude requisitada (FL 360) e não aquela efetivamente autorizada (FL 370). Já mostrei em inúmeros posts aqui, que as informações apresentadas em seus consoles estavam corretas, como foi comprovado no relatório do CENIPA e que não foi isso que provocou a falta de iniciativas dos controladores em adotar procedimentos que pudessem ter evitado o acidente e sim o caráter insólito dos eventos. A partir de um jogo de palavras, a IFATCA, ABCTA e consequentemente o NTSB, querem fazer crer que a autorização verbal que foi emitida ao Legacy de um nível único é aquela que os sistemas de informação deveriam refletir. Ou seja, gostariam que os sistemas de informação utilizados pelos controladores apresentassem como plano autorizado aquele que foi fornecido por rádio e omitiu as altitudes após Brasília. A IFATCA diz em seu comunicado:
"Em muitos ACC do mundo, a informação crucial do nível de vôo autorizado é alimentado pelos controladores no sistema tão logo a autorização é transmitida por rádio para as aeronaves (e ela tenha sido corretamente cotejada pelo piloto). Esta ‘alimentação do sistema’ é algumas vezes feita por escrito à mão, em papel (sic), enquanto outros sistemas por via eletrônica segundo a qual a entrada é feita diretamente sobre a etiqueta do vôo, que aparece em tela do radar no CWP (Posição de Trabalho do Controlador). O que é muito importante, mesmo determinante, é que o sistema em terra do ATC e as cabinas dos aviões sempre disponham das mesmas informações. A IFATCA acredita que os operadores no ar (os pilotos) e os em solo (os controladores) não possam ser vitimas de armadilhas inadmissíveis de sistema decorrentes de sistemas de controles de tráfego ‘não tolerantes a erros’ e ‘mal desenhados' dos equipamentos de vôo em uso. Estamos seguros de que nossas declarações relativas a este equipamento são precisas, e o citado equipamento é responsável por iniciar a cadeia acontecimentos fatais de 29 de setembro de 2006 e, portanto, contribuiu para a colisão” (tradução do autor a partir do texto em inglês).

Isto está muito longe da verdade e estas palavras da IFATCA demonstram a falta de conhecimentos básicos de lógica de sistemas de informação, seus desenhos e interfaces, a começar pela infeliz frase “Esta alimentação do sistema é algumas vezes feita por escrito à mão, em papel, ...”. Alguém conhece alguma entrada de dados em sistema em papel? Só se for da loteria. Se o nível de vôo autorizado deve ser aquele que foi requisitado, não há necessidade de voltar a redigitá-lo. Alguém acredita que exista um sistema em algum lugar do mundo que alguém leia na tela do computador um plano de vôo autorizado para o piloto e tenha que redigitá-lo simplesmente para confirmar o que leu para o piloto? É claro que não é isto. Seria até uma forma de introduzir uma quantidade enorme de erros no sistema, ou seja, poder-se-ia ler corretamente e digitar errado. Como confiar na correta digitação do controlador? É claro que estaria muito mais sujeito a falhas. Os controladores precisam digitar uma nova altitude quando o nível autorizado é diferente do requisitado. O que deve ser verbalizado pelos controladores e transmitido aos pilotos é exatamente o que está registrado nos sistemas de informação e vê em sua tela, o plano completo que está sendo autorizado. Então, se o controlador ler o nível errado do vôo ou lê-lo de forma incompleta, não há nenhuma maneira que o sistema informatizado tenha a informação correta. A ordem dos eventos previstos para os controladores é: 1) introduzir o plano requisitado no sistema, digitando-o ou em geral feito eletronicamente; 2) analisar eventuais conflitos com outras aeronaves; 3) se necessário, alterar os níveis a serem autorizados e digitar os níveis que serão autorizados; 4) ler exatamente, precisamente e completamente o que está registrado no sistema para os pilotos. O erro do controlador foi ler a autorização parcialmente e não alertar aos pilotos que estavam sendo autorizados como requisitado e registrado no sistema (“as filed”). A sugestão apresentada pela IFATCA e NTSB, esta sim é muito mais sujeita a erros. Além disto, os sistemas estão evoluindo em muitos lugares do mundo, e muitos já implementaram para que todas as informações fluam eletronicamente do sistema em solo para as aeronaves através de links de dados, dispensando as autorizações verbais. Em alguns lugares há leituras através de vozes digitalizadas. Mas, em geral, os pilotos antes de iniciar o vôo, já introduzem no sistema gerenciador da aeronave o plano de vôo requisitado completo e aguardam receber a autorização por rádio como requisitada. Para eles, o plano de vôo autorizado não é uma surpresa, é uma confirmação. Isto como ficou claro, não foi feito pela tripulação do Legacy, que ficou conhecendo as altitudes quando já estavam taxiando na pista.

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