quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Cenipa erra na análise da passagem do Legacy sobre Brasília e NTSB se aproveita disto

É muito estranho o Cenipa não saber o que são os serviços de “Vigilância Radar” e “Vetoração Radar”. Aparentemente ele troca as bolas.

Diz o Cenipa:
"A última informação recebida pela tripulação do N600XL, em contato bilateral com o órgão ATC, foi às 18:51 UTC, quando foi informado que a aeronave estava sob Vigilância Radar, conforme o previsto no item 14.11 da ICA 100-12/2006.
Esta condição de vôo foi informada após os pilotos terem acionado a função “identificação” no Transponder, cujo código 4574 foi alocado pelo Centro Brasília, de acordo com o item 14.11.2 ,letra a, da ICA 100-12/2006.
Nessa condição, é responsabilidade do controlador de tráfego aéreo (ATCO) instruir a tripulação a mudar o nível de vôo, uma vez que esta não pode realizar nenhuma mudança de nível de vôo sem a autorização do órgão de controle".

Mas não é isto o que diz a ICA 100-12/2006 sobre vigilância radar:
14.11.4 Durante a prestação do serviço de vigilância radar, a responsabilidade da navegação é do piloto em comando da aeronave.

Apenas quando o serviço é de vetoração radar, que não era o caso do vôo do Legacy, é que a responsabilidade pela navegação da aeronave recai sobre o controlador de vôo; tudo de acordo com ICA 100-12:
"14.12.1 A vetoração radar é o mais completo serviço radar proporcionado. Sempre que uma aeronave estiver sob vetoração radar, será proporcionado o controle de tráfego aéreo e o controlador será responsável pela navegação da aeronave, devendo transmitir para a mesma as orientações de proa e mudança de nível que se tornarem necessárias".

Deve ser observado que, nos termos da ICA 100-12, não se exige a notificação. Por isso não houve contato, via rádio, entre a aeronave e o Centro de Controle. Dizem as normas:
14.19.1 Uma aeronave sob vetoração ou vigilância radar fica dispensada de reportar:
a) os pontos de notificação compulsória;
b) ao atingir ou abandonar um fixo de espera; e
c) ao entrar em nova fase ou perna de um procedimento de saída".

Às 18:51 (UTC) o Legacy entra em contrato por rádio já próximo à Brasília. O diálogo é breve:
Legacy: BRASÍLIA, NOVEMBER SIX HUNDRED X-RAY LIMA. LEVEL… FLIGHT LEVEL THREE SEVEN ZERO, GOOD AFTERNOON.
Brasília: NOVEMBER SIX ZERO ZERO X-RAY LIMA, SQUAWK IDENT, RADAR SUVEILLANCE.
Legacy: ROGER.

O Cenipa comenta sobre este diálogo:
"Assim, como os pilotos do N600XL não receberam nenhuma nova instrução, mantiveram o nível de vôo FL370, o qual era incorreto, naquele sentido de vôo, para a aerovia UZ6".

Em outro trecho o Cenipa comenta:
"Vale, contudo, ressaltar que o fato de estarem sob vigilância radar e ouvindo permanentemente outras conversas entre aeronaves, contribuiu para o relaxamento da tripulação".

Como poderiam "relaxar" se a responsabilidade sobre a navegação era dos pilotos?

O item 14.21 mostra como deve ser a passagem para o controle radar e confirmação de identificação:
"14.21 TRANSFERÊNCIA DE CONTROLE RADAR
14.21.1 A transferência de controle radar deve ser feita sempre que a aeronave passar da responsabilidade de um órgão ou setor para outro órgão ou setor de controle de tráfego aéreo que proporcione serviços radar.
(...)
14.25 CONFIRMAÇÃO DE IDENTIFICAÇÃO
Após o controlador ter aceito a transferência de controle radar de outro órgão ou setor deverá:
a) confirmar a identificação de um alvo primário, informando à aeronave a sua posição;
b) confirmar a identificação de um alvo secundário pela informação de uma mudança de código, por um acionamento “IDENT” ou por uma seleção “STANDBY”, a menos que um desses métodos tenha sido usado durante a transferência;
c) considerar identificada uma aeronave à qual tenha sido atribuído um código discreto; ou
d) considerar a identificação confirmada quando o alvo secundário, ou pista, estiver associado à etiqueta".

Portanto está claro que no único diálogo com Legacy e o Controle eles atenderam perfeitamente as normas técnicas e não tinham porque comunicar à tripulação, que ainda não haviam chegado à vertical de Brasília, que depois de Brasília deveriam alterar a altitude. Não tinham porque fazer isto porque estavam sob o regime de vigilância radar (radar surveillance) e não sob vertoração radar. O NTSB aproveitou-se disto para dizer que o ATC não teve a iniciativa de comunicar a alteração de nível do Legacy. Por que será que o NTSB não apontou o erro do Cenipa?

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