Muitos têm procurado este blog, acredito que estudantes, em busca de respostas para as causas da crise aérea. O foco deste blog não é este, mas sim de contestar as afirmativas do Sr. Joe Sharkey, jornalista que estava no Legacy que colidiu com o Boeing da Gol e, que procura afirmar a completa inocência dos pilotos americanos, imputando toda a culpa à crise aérea brasileira. Entretanto, não tenho a pretensão de dar todas as respostas, mas resolvi resumir aqui a minha opinião, já que a partir dela outros possam buscar seus caminhos para chegar a suas próprias opiniões. Não sou “petralha” como querem me caracterizar, não trabalho para o governo, não sou militar, só navego contra a maré.
Como Sharkey coloca como grande culpado no acidente da Gol o controle do tráfego aéreo brasileiro, que por sua vez é conduzido pela aeronáutica e por órgãos governamentais, a "culpa" enfim dos graves acidentes que ocorreram seria do governo brasileiro. Com isso, o objetivo do Sr. Sharkey é claro, consegue o grande colegiado da oposição para confundir o maior número de pessoas sobre as verdadeiras causas dos acidentes. Além dos laços afetivos que foram criados com os pilotos, que apesar de tudo, salvaram-lhe a vida ao pousar em segurança na base militar de Cachimbo, Sharkey teve sua viagem ao Brasil patrocinada pela Excelaire e Embraer para colher material para suas "reportagens". Está claro que ambas querem tê-lo ao seu lado. Mas neste salve-se quem puder, Sr. Sharkey e Excelaire atribuem as falhas do transponder à Embraer e à Honeywell, fabricante do transponder.
As verdadeiras causas deste acidente é o que faz este blog existir, e toda a sua análise está exaustivamente descrita em inúmeros posts que podem ser encontrados aqui, mas um resumo pode ser encontrado no quadro ao lado, em "Quem é Joe Sharkey".
Mas antes de nos aprofundar nestes aspectos, vamos analisar o que é a crise aérea. Podemos dizer que a crise aérea está relacionada primordialmente com as falhas de segurança tanto do controle do espaço aéreo quanto da infra-estrutura aeroportuária e aeronáutica. Completa a crise aérea os atrasos, cancelamentos de vôos e transtornos para os passageiros.
As falhas de segurança do espaço aéreo resultaria principalmente do controle inadequado dos vôos, pondo as aeronaves em risco de colisão, como a do Legacy e o Boeing da Gol. O controle do espaço aéreo no Brasil é feito pelo Cindacta, órgão da FAB, portanto controlado pelas Forças Armadas. No Brasil, o controle do tráfego aéreo e da defesa aérea é integrado, ou seja, exercido unicamente pela Aeronáutica. Nos EUA o controle do tráfego aéreo é civil, e a defesa aérea, obviamente, é militar. A discussão sobre este tema passou a ser extremamente curiosa. Por exemplo, um especialista deste tema, Nelson Francisco Düring, responsável pelo site Defesa@Net, e declaradamente contra o governo Lula (clique aqui) mostra em um dos seus artigos como os índices de incidentes aéreos, ou seja, “toda a vez que há suspeita de que uma aeronave voando teve sua ‘bolha de proteção’ tocada (pelo solo ou por outra aeronave)” (clique aqui), vêm se reduzido progressivamente desde 1998. É ele que afirma "Quando comparados os dados de 2004 e 2005, é possível concluir que houve uma diminuição total da relação do número de incidentes de tráfego aéreo por 100 mil movimentos de tráfego realizados no país". O curioso é que este índice no primeiro semestre de 2006, ou seja, um pouco antes do acidente da Gol, é metade ao igual período de 2005. Compara até com indicadores americanos, mostrando nossa superioridade. Ele se coloca como um profundo opositor do governo Lula, mas ao mesmo tempo se coloca como defensor do controle militar sobre o tráfego aéreo, demonstrando sua eficiência. Nos EUA, depois dos ataques de 11 de Setembro, estão sendo feitos grandes esforços e investimentos para integração com a defesa aérea. De qualquer forma, são recursos duplicados em controlar e defender o espaço aéreo. Esta é uma discussão ainda não concluída, mas parece estar mais ligada a problemas trabalhistas do que segurança dos vôos.
Outro elemento visível da crise aérea é o da chamada crise dos aeroportos, ou seja, atrasos e cancelamentos dos vôos. As causas disto não podem estar mais claras. Os índices de eficiência das companhias aéreas brasileiras sempre se situaram acima dos 90% antes do acidente da Gol. Após o acidente, com a culpa sendo imputada aos controladores de vôo, houve uma reação natural deste grupo de profissionais, apontando suas más condições de trabalho e equipamentos inadequados. Mesmo assim, nenhum dos controladores de vôo que foram acusados assumiu que isto tivesse contribuído para acidente. Nenhum disse que por estarem sobrecarregados ou por falha de equipamento colocaram o Legacy em nível incorreto. Nenhum admitiu terem cometido alguma falha neste episódio. Somente se insurgiram contra as suas condições de trabalho e qualidade dos equipamentos de monitoragem, e passaram a fazer “operação-padrão”. Parece-me uma situação perfeitamente compreensível. Se o lugar que trabalham é acusado por todos de incompetência, ineficiência, ou seja, estiver no meio desta enorme contenda política, como vão reagir? Se houver ineficiência, não é nossa, das pessoas que aqui trabalham, mas das nossas condições do nosso trabalho, dizem os controladores de vôo.
Por último, o que completa a crise aérea é a precariedade da infra-estrutura aeroportuária, ou seja, os aeroportos. Esta infra-estrutura é mantida pela Infraero, uma empresa pública. Embora esteja presente nas críticas dos atrasos e cancelamentos dos vôos de forma vaga, já que tem um papel secundário neste aspecto, o foco das críticas tem sido as condições de segurança do aeroporto de Congonhas. A crítica à Congonhas, para causar impacto, só pode ser bem sucedida se colocar questões de risco. Neste sentido o acidente da TAM veio a calhar, porque embora o acidente pudesse ter ocorrido em outros aeroportos do mundo, por uma ironia do destino, veio acontecer logo ali. As críticas ao aeroporto começam pela sua localização próxima aos edifícios. Entretanto, há inúmeros aeroportos no mundo cercados pela malha urbana. Todos os aeroportos mais antigos, viram-se cercados pela ampliação das cidades e mesmo assim não foram desativados, mas simplesmente não recebem aeronaves de grande porte. Congonhas não tem mais risco que outros aeroportos que outros aeroportos que não estão inseridos no tecido urbano, porque não importa para os aviões se o que está abaixo deles é água, mata ou edifícios. As fatalidades dos que estão no avião acidentado serão iguais em qualquer caso. Mais inseguros são aeroportos cujo entorno topográfico cria mais dificuldades para a aproximação das aeronaves. Lembre-se que o Learjet dos Mamonas foi se chocar com a serra da Catareira após uma aproximação mal sucedida em Guarulhos, quando erraram a direção para uma reaproximação. A proximidade dos edifícios é só uma questão de incômodo para os moradores e, por isso, estes aeroportos têm limitações de horário de funcionamento. Não se trata de uma questão de segurança. Para os moradores é um risco infinitamente pequeno, comparado a outros riscos de morte que estamos sujeitos. Moro a 500 metros do final da pista de Congonhas, e meu receio não são os aviões, mas sim a violência urbana e acidentes de trânsito. Sei que a probabilidade de um avião cair na minha cabeça é desprezível. Até mesmo neste acidente, o avião, por uma estranha coincidência, veio a se chocar justamente com um depósito de carga aérea, que em outros aeroportos poderia estar situado até dentro das próprias instalações do aeroporto. Fala-se muito do comprimento da pista, e compara-se com as pistas de aeroportos que operam grandes aviões. Estes aeroportos têm pistas longas para permitir a decolagem destes grandes aviões, que por causa de seu peso exigem pistas longas. Aviões como os 737 e A320 foram projetados para operar em pistas das dimensões de Congonhas. Mais detalhes pode ser vistos em meu outro post Cenário de um acidente. A situação de Congonhas é muito parecida com os aeroportos regionais Midway de Chicago e Reagan de Washington. Ambos com pistas do tamanho de Congonhas e situados dentro da malha urbana. Nem por isto estão sendo desativados. Há críticas também de que os investimentos foram feitos nos terminais e nas instalações e não nas pistas. Em Congonhas, ampliações de pista são impossíveis e não significativas em termos de segurança e, quanto à sua manutenção, encontram a maior dificuldade na pressão das companhias aéreas para que o Infraero não interrompa suas operações para corrigir a pista.
É claro que na análise da infra-estrutura dos aeroportos emirjam todas as mazelas da aliança entre a corrupção do poder publico e os empresários que aproveitam-se de vantagens ilícitas. Obras superfaturadas, concorrências fraudulentas e tudo que envolve o relacionamento entre governo e empresas privadas. Está claro, que diante desta crise, a pressão por novas obras se acentuem. Novas pistas, novos aeroportos, novas instalações. Nada mais oportuno que esta situação para as grandes construtoras, como a do amigo de Renan Calheiros, a Mendes Junior, proponham novas obras. Esqueçamos a saúde, educação, economia, corrupção e problemas menores. Vamos discutir os novos aeroportos que é mais importante.
Parece que está mais do que claro que a crise aérea é uma crise política desencadeada pelo acidente da Gol. Este acidente explodiu sim a crise aérea, que até então estava restrita à crise da corrupção das alianças entre poder público e privado, como está em tudo onde estão unidos, como nas obras de infra-estrutura e verbas publicitárias, ou seja, todas as formas de fornecimento de bens e serviços ao governo. Mas em nenhum evento pode-se associá-la às causas destes dois grandes acidentes aéreos. É a politização do discurso quando falta a razão. É a forma mais simples quando se quer colocar debaixo do tapete as verdadeiras causas destes acidentes. É o aproveitamento das oportunidades para se destacar na mídia e favorecer carreiras políticas. E é tudo que desejam os pilotos do Legacy e a Excelaire para nunca mais precisar voltar ao Brasil e serem responsabilizados por seus atos.
domingo, 26 de agosto de 2007
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